A Evolução Boffiana
Vejam o que escreve Leonardo Boff em seu artigo semanal para o Blog do Noblat de hoje, sobre evolução:
Inegavelmente há um processo em curso que já tem bilhões de anos: a ascensão rumo à consciência. A partir de geosfera (Terra) surgiu a hidrosfera (água), em seguida a litosfera (continentes), posteriormente a biosfera (vida), a antropofesfera (ser humano) e para os cristãos a cristosfera (Cristo).
Para quem achava que o criacionismo evangélico era o que havia de pior, eis a evolução boffiana para mostrar que o fundo do poço é bem mais embaixo.
Esse é do bom!
Precisamos descobrir com urgência o que o Leonardo Boff anda fumando. Leia o texto abaixo, publicado originalmente no Blog do Noblat, e avalie você mesmo o teor de THC do material consumido pelo teólogo.
O novo patamar da mundialização: a noosfera
A atual crise econômica está colocando a humanidade diante de uma terrível bifurcação: ou segue o G-20 que teima em revitalizar um moribundo – o modelo vigente do capitalismo globalizado – que provocou a atual crise mundial e que, a continuar, poderá levar a uma tragédia ecológica e humanitária ou então tenta um novo paradigma que coloca a Terra, a vida e a Humanidade no centro e a economia a seu serviço e então fará nascer um novo patamar de civilização que garantirá mais equidade e humanidade em todas as relações a começar pelas produtivas.
S.I.S.T.E.M.A.
Para os saudosistas do Agente 86 (lembram da K.A.O.S. e o do C.O.N.T.R.O.L.E.?), um artigo sobre o S.I.S.T.E.M.A. do Leonardo Boff, diretamente da década de 1960 (via blog do Noblat):
Nova cartada do sistema?
O encontro dos G-20 em Londres levou a uma tensa convergência entre as propostas norteamericana e a européia. Esta prevê controles e regulações mais rígidas dos mercados e a nortemaericana procura salvar o sistema bancário privado com a injeção estatal de bilhões e bilhões de dólares, tirados dos contribuintes, com o propósito de alavancar os créditos e garantir a continuação do consumo. Há indicações de que Barack Obama se comprometeu a assimilar algo da proposta européia e desta forma criar um consenso mínimo para enfrentar coletivamente a crise.
Cumpre, entretanto, reconhecer que ambas as soluções são intrasistêmicas e nada inspiradoras. pois de modo algum colocam em xeque o modo de produção capitalista e sua expressão política, o neoliberalismo. Curiosamente, Sarkosy, num artigo do dia 1 de abril, propunha um capitalismo cooperativo e solidário como forma de sair do caos. Parece entender pouco da lógica do capital, pois este se rege pela competitividade e não pela cooperação. A solidariedade na é categoria do capital, senão não teríamos tantos milhões de excluídos. Se alguém achar que o capitalismo é bom para os trabalhadores é um iludido. O capital é bom para os capitalistas que detém o ter, o saber e o poder.
Os encamnhamentos dos G-20 mantém a acumulação do capital como o principal motor do funcionamento da economia e o mercado livre como o lugar de sua reprodução. Isso simplesmente é mais do mesmo. Não ataca as causas que levaram à crise. A crise econômico-financeira é vista fora do contexto global de crise: social, alimentaria, energética, climática e ecológica. Todas estas crises são consideradas como externalidades, quer dizer, fatores que não entram na contabilidade do capital, como o deslocamento de milhões de pessoas do campo para as cidades, o desflorestamento, a contaminação do solo, do mar e do ar. Estes fatores só são tomados em consideração quando se revelam empecilho para os ganhos do capital.
Mas não há como evitar a questão ética: trata-se de uma solução que contempla a humanidade como um todo e que garante a vitalidade ao planeta Terra? Ou simplesmente se trata de salvar o sistema do capital para beneficiar os que acumulam? Será mais uma cartada do sistema? Trata-se de uma crise no sistema ou uma crise do sistema?
Tudo indica que se trata de uma crise do sistema. As duas externalidades maiores – a social e a ambiental – não ganham centralidade. Mas elas são de tal gravidade que põem em xeque as soluções propostas, possuindo somente sustentabilidade a curto e a médio prazo. Depois voltará a crise, possivelmente, sob a forma de tragédia ou de farsa (Marx).
A crise social mundial é terrificante. Os dados do PNUD 2007-2008 atestam que os 20% mais ricos absorvem 82,4% das riquezas mundiais enquanto os 20% mais pobres têm que se contentar com apenas 1,6%. Quer dizer, é uma pequeníssima minoria que, em escala mundial, monopoliza o consumo enquanto os zeros econômicos são lançados na miséria. Há mais de 900 milhões de famintos e a cada quatro segundos morre um ser humano de fome conforme refere J. Ziegler em seu relatório para a ONU sobre a pobreza no mundo. Que cabeça e que coração têm analistas notáveis do Brasil (vide M. Leitão e Sardenberg) que sabem disso tudo e mesmo assim defendem um sistema de tanta perversidade?
A crise ecológica não é menor. Estamos já dentro do aquecimento global que vai ser devastador para milhões de pessoas e para a biodiversidade. E. Wilson, renomado biólogo, denunciou que a cada ano a voracidade capitalista elimina definitivamente 3.500 espécies de seres vivos. Diante deste quadro dramático, só nos resta repetir o que deixou escrito em latim o gênio da critica ao capital: “dixi et salvavi animam meam”: “disse e salvei a minha alma”.
Sentimentos morais revisitados
Logo abaixo, um excelente artigo do Luís Fernando Veríssimo, publicado originalmente no blog do Noblat:
Resgatando Adam Smith
Quando a nobreza parisiense perdeu a cabeça, literalmente, na Revolução Francesa as cabeleireiras da cidade ficaram sem emprego. Sua profissão, que incluía a montagem e manutenção de perucas, também fora guilhotinada. E foi a este contingente de desempregadas pela falta de cabeças que o barão Gaspard Riche de Prony recorreu quando inventou uma espécie de linha de montagem matemática para recalcular tabelas numéricas, já que a nova república adotara o sistema decimal. De Prony se inspirou em Adam Smith, que no seu “A riqueza das nações” descreve a divisão de trabalho numa fábrica de alfinetes. As moças recrutadas pelo barão só precisavam saber somar e subtrair, a inteligência estava na organização do seu trabalho, que lhes permitia fabricar logaritmos como alfinetes. Quando o matemático inglês Charles Babbage visitou a “fábrica” de de Prony em Paris se deu conta que as cabeleireiras podiam ser substituídas pelos dentes de uma engrenagem, e uma máquina podia fazer o mesmo trabalho. E inventou o que chamou de “Difference Engine”, o primeiro calculador mecânico bem sucedido (máquinas de calcular rudimentares tinham sido boladas, por Pascal e Leibniz entre outros, desde o século 17). Assim, nas origens do computador moderno – está o Terror.
Pode-se especular o que se originará da Crise que nos assola. Também teremos multidões de desempregados, mas com poucas chances de serem aproveitados em alguma nova tecnologia, como as cabeleireiras da França. Não haverá investimentos em novas tecnologias. É pouco provável que a Crise produza algum tipo de bonapartismo salvador como a revolução, mas é possível que o clima político que virá lembre o da restauração pós-Bonaparte, a nossa frustração com o fracasso do socialismo e agora com esse vexame do capitalismo imitando o desencanto com a promessa libertária esgotada da revolução.
Naquela época o espirito da Restauração também determinou uma mudança no pensamento econômico. Adam Smith, cuja obra antes de “A riqueza das nações” podia ser confundida com pregação reformista (ele era invocado até por Tom Paine, um dos teóricos da Revolução Americana) e incluía uma “Teoria do sentimento moral” passou a ser visto como profeta da economia como uma ciência moralmente neutra e um herói da reação, como é até hoje. Ou era até ontem. Talvez um dos efeitos da Crise seja o resgate do Adam Smith da primeira fase. Nos discursos feitos hoje contra os desmandos do capital financeiro que deram na Crise não se ouve outra coisa a não ser repetidos apelos pela volta do sentimento moral.
É prá lá ou prá acolá?
Mais um excelente texto do Luís Fernando Veríssimo, do blog do Noblat:
Esquerda, direita etc.
O DNA não tem ideologia. Ou tem? Ele prova que todos nascem com o mesmo sistema de códigos, e portanto são iguais – ponto para a esquerda -, mas que cada indivíduo tem uma senha diferente, ponto para a direita, se bem que não necessariamente para os racistas.
Na velha questão biologia x cultura, o DNA dá razão a quem diz que características adquiridas não são hereditárias, nenhuma experiência cultural afeta os genes transmitidos e a Humanidade não ficará mais virtuosa com o tempo, muito menos socialista. Mas a própria descoberta do DNA e todas as projeções do que será possível fazer com a manipulação do material genético mostram como o ser humano pode, sim, interferir na sua própria evolução, e como existe nele uma determinação inata para o autoaperfeiçoamento. Parafraseando Marx: os cientistas sempre se preocuparam em compreender o ser humano, agora podem tratar de mudá-lo. Biologia não é, afinal, destino.
Mas a eugenia é uma ciência com uma péssima reputação. Seu apogeu anterior foi nos experimentos nazistas com prisioneiros durante a guerra.
E o exato significado de “aperfeiçoamento” é discutível. Uma pessoa “melhor” é uma mais preparada, pela aparência e a capacidade físicas padronizadas, e pelo espírito empreendedor, para as competições da vida ou uma pessoa mais solidária e mais tolerante com a variedade humana?
Essa indefinição ideológica dos nossos genes é apenas outra contribuição para uma longa lista de paradoxos. É “de esquerda” ser a favor do aborto legalizado e contra a pena de morte, enquanto direitistas defendem o direito do feto à vida, porque é sagrada, e o direito do Estado de matá-lo se ele der errado, embora sejam contra a interferência do Estado no resto da sua vida. A direita valoriza o indivíduo acima da sociedade, que é uma abstração, como dizia a Sra. Thatcher, mas aceita a desigualdade, ou o sacrifício de muitos indivíduos pelo sucesso de poucos, como natural. A esquerda muitas vezes atribui a um estado impessoal ou a um líder superpersonalizado a incongruente realização de um ideal igualitário. Et cetera, et cetera. E, aparentemente, o DNA não vai nos dizer se estamos condenados a ser contraditórios de uma maneira ou de outra. Era só o que nos faltava, o DNA ser do centrão.
Feliz é a mosca, que tem mais ou menos a nossa estrutura genética, mas absolutamente nenhuma curiosidade sobre o que ela significa.
Lendas darwinistas
Incrível como a Teoria da Evolução é mal compreendida, mesmo por quem a aceita. Uma das principais confusões que se faz é sobre o próprio significado da palavra “evolução”, entendida no senso comum como avanço, melhoria, como na charge acima (publicada no blog do Noblat), que trata do caso do aborto da menina de 9 anos que fora estuprada pelo padrasto. Nela, o chargista tentou fazer uma crítica à Igreja Católica, que teria sido retrógrada (não evoluída) ao condenar à excomunhão os envolvidos no aborto, mas poupado o próprio estuprador.
Eu mesmo achei a posição da Igreja retrógrada, como se pode ver nesse post. O problema é que a palavra evolução, quando colocada na boca de Charles Darwin, não significa a mesma coisa que evolução no senso comum. As espécies não evoluem para ficarem melhores ou mais avançadas, a evolução darwinista é sobre a sobrevivência diferencial dos indivíduos mais adaptados ao meio em uma determinada população, mesmo que isso signifique retrocesso. Por exemplo: determinados peixes deixam de ter olhos funcionais ao evoluírem para sobreviver em profundidades marinhas abissais, e não se pode dizer que peixes cegos são mais avançados que peixes que enxergam, se tomarmos a palavra evolução no seu senso comum.
Outro equívoco da charge é insinuar que o ser humano seria a espécie mais evoluída do planeta. Nós não somos mais evoluídos que uma formiga, uma samambaia ou uma bactéria modernas: nós somos tão evoluídos quanto estas espécies. O fato de termos mais capacidade cognitiva ou desenvolvermos tecnologia e cultura nos faz mais evoluídos no senso comum, mas não no sentido darwinista do termo. Nós somos tão adaptados a sobreviver no meio ambiente quanto qualquer outra espécie viva, e mesmo em relação às espécies extintas, também seria incorreto dizermos que alguma é mais ou menos evoluída, já que estas eram adaptadas no meio ambiente delas.
De qualquer maneira, no mesmo blog do Noblat, também é possível encontrar um exemplo de autor “leigo” (não biólogo) que entende, de fato, o que significa evolução no sentido darwinista. Vale a pena ler esse artigo, do Luís Fernando Veríssimo, para ver um exemplo de bom texto sobre darwinismo.
Nosso futuro
Acabei de ler uma matéria chocante no blog do Noblat que me lembrou imediatamente o poema “O Bicho”, do Manuel Bandeira, abaixo reproduzido. É com muito pesar que relembro que o relatado na matéria existe, que vai continuar a existir, e que nossos netos lerão reportagens idênticas daqui a 50 anos. Desculpem pelo tom pessimista, mas é a realidade.
O Bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Papai Noel
Eu me lembro perfeitamente quando descobri que Papai Noel não existia. Tinha uns 5 ou 6 anos, e estava no cinema num domingo de manhã (na época, havia sessões de cinema para crianças aos domingos de manhã, era a “Sessão Zig-Zag”), assistindo ao Canal 100 (noticiário que passava antes dos filmes) com meu primo. Como ele era uns 4 anos mais velho que eu, já sabia da farsa natalina há tempos, e resolveu me sacanear: “Você sabe que essa história de Papai-Noel é mentira, né?”. Lógico que não dei o braço a torcer, e embora estivesse chorando por dentro, disfarcei e fingi que já sabia que Papai Noel era uma fantasia, mas foi um choque para mim, um baita choque. (O interessante é que, hoje em dia, esse mesmo primo é um sujeito extremamente místico, já tendo morado, inclusive, em uma comunidade do Santo Daime por diversos anos, no meio da floresta, ao passo que eu sou o extremo oposto, um sujeito de um ceticismo muitíssimo arraigado – mas essa é uma outra história).
Se você quiser ler uma outra crônica sobre o Papai Noel e os mitos de Natal, não perca o excelente texto abaixo, da Altenéia Feijó, direto do blog do Noblat:
E se Papai Noel existir?
Nos meus tempos de criança só ganhava presente de Natal quem acreditasse em Papai Noel. Então a gente escrevia (ou ditava) carta, prometia se comportar bem e fazia um pedido dando várias opções para o presente. Eu só pedia o que estava dentro das possibilidades da minha família. Quem disse que não há intuição ou sabedoria infantil? Ah, antes de me deitar, deixava um sapatinho perto da janela aberta do quarto e tentava ficar acordada a fim de flagrar a chegada do bom velhinho. Aí minha mãe me explicava que, enquanto eu não adormecesse, ele não viria. Depois, quando já não acreditava mais na lenda, fingia dormir para meu pai continuar colocando um brinquedo novo no meu sapato.
Um belo dia, muitos anos após, chegava eu do trabalho quando meu filho, na época com 6 anos, me cercou e foi direto na pergunta:
– Mamãe, Papai Noel existe de verdade?
– Enquanto você acreditar nele, existe!
– Vou continuar acreditando…
Hoje, em quase cada esquina comercial dá para avistar uma figura humana fantasiada de Papai Noel. Banalizou-se o lendário bom velhinho. Quem diria, transformou-se em figuração remunerada. E nada de espantos porque isso faz tempo. A notícia é que neste fim de ano os shoppings brasileiros contrataram 700 pessoas em todo o país para trabalhar como papais noéis. Segundo a Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), alguns podem ganhar até R$ 8 mil durante a temporada. Sim, a remuneração se diferencia por vários e interessantes aspectos. Por exemplo: ganha um cachê mais alto quem tiver uma barba branca verdadeira e bem cuidada, melhor desempenho na encenação e empatia. Além disso, existem cursos para preparar candidatos, ensinando-lhes técnicas de maquiagem, como compor e vestir a fantasia, como tratar as crianças e algo mais.
Na realidade, se não houver um certo talento, em vez de atrair e encantar os pequenos o Papai Noel contemporâneo pode assustá-los. Afinal, apesar de ter virado uma atividade no mercado de trabalho, sua figura precisa continuar tendo algum apelo lúdico. Nos shoppings essa preocupação é mais explícita. Sem conseguir escapar da competição capitalista, papais noéis se esforçam para se manterem “ludicamente” atraentes. Isso é ruim? Não. Pelo menos é um trabalho temporário bem remunerado, favorece a criatividade, agrada consumidores adultos e a criançada.
A origem do bom velhinho embasada na história do bispo São Nicolau que presenteava crianças por gosto, na região da atual Turquia, quase ninguém mais conhece. No século XVII a lenda foi levada pelos holandeses para os Estados Unidos. Aí, em 1931, a Coca-Cola realizou uma campanha publicitária na qual o artista Habdon Sundblom remodelou a imagem do Santa Claus (o São Nicolau). Tornou-o bonachão e comunicativo. Mais. Substituiu sua roupa de inverno marrom pelo vistoso traje vermelho. Deu certo. Agora, com esta crise mundial, parece desejo do presidente Lula que se invente um Papai Noel brasileiro. Bem… Se a gente quiser acreditar… Ho, ho, ho.
Como se locomover em São Paulo
Numa cidade como São Paulo, há de ser criativo para se locomover, e não ha mágicas a serem feitas. A opção “ganhar na mega-sena e comprar um helicóptero”, por exemplo, parece boa, mas é impraticável. Ao contrário do que todo mundo pensa, você não pega o seu helicóptero e vai no shopping, depois na manicure, e no caminho para casa pega o Júnior na escolinha e dá uma passada no supermercado. Helicóptero leva o banqueiro, da sede do banco, na av. Paulista, para uma reunião com um cliente em Diadema, e, depois para um almoço em Campinas. Tudo planejado antecipadamente, e devidamente autorizado pelo controle aéreo. Em resumo: na prática, o helicóptero não resolve o problema de transporte de uma pessoa normal em 99% dos casos – sem contar que ganhar na mega-sena para comprá-lo também não é tarefa das mais fáceis.
Condenado a rastejar pelas ruas superlotadas, o motorista paulistano soferá com 1)a morosidade absurda do trânsito; 2)o custo, não só de gasolina, mas principalmente do desgaste prematuro que o carro irá sofrer; e 3)o risco de ser abordado por um trombadinha no semáforo. Blindagem ajuda, mas não resolve: conheço histórias de assaltantes que pegam um transeunte de refém (quem teria coragem de deixar o outro levar um tiro na cabeça?) e roubam o motorista do mesmo jeito. Transmissão automática, iPhone, som de última geração e DVD a bordo deixam o trajeto menos cansativo, mas não economizam tempo. Só há uma solução: apelar para uma combinação de metrô e táxi, mas… E o conforto, onde fica? No táxi, até que tudo bem, a maioria tem ar-condicionado e a frota de S.Paulo é relativamente nova e bem conservada. Mas andar de metrô com conforto exige técnica, como veremos.
Embora novos e limpos, é certo que você não vai encontrar vagão de metrô com carpete alto e banco de couro (nem ar-condicionado), mas dá para viajar com bastante diversão. Primeiro: tente evitar os horários de rush. Mude seu horário de trabalho, encaixe tarefas que podem ser feitas a qualquer hora (ex.: responder e-mails sem urgência) nos horários de pico, e procure entrar no metrô fora dos seguintes horários a)8:00-10:00h; e b)17:00-19:00h. Segundo: leve diversão para o metrô, como um livro ou uma revista, joguinhos de celular e, preferencialmente, um iPod equipado com headphone anti-ruído (vide esse post aqui). Ultimamente, eu tenho usado o iPod para ouvir áudio-livros, mas você pode ouvir música e até rádio (nos trechos acima da terra, óbvio), além de uma cadernetinha para anotações. (Eu falo mais sobre esse assunto nesse post aqui).
Uma outra opção é não levar nenhum gadget, e enfrentar os horários de pico com galhardia. A vantagem? Ouvir a conversa dos outros e ficar reparando nos tipos que habitam o subterrâneo. Que é o que sugere a Sandra Paulsen, no artigo abaixo, publicado hoje no blog no Noblat (tudo bem, ela fala da Suécia, mas é a mesma coisa em S.Paulo)):
Lata de sardinha «cultural»
Esta semana, os jornais locais touxeram notícias sobre a idéia de reduzir os assentos no metrô de Estocolmo, a fim de abrir mais espaço para as pessoas em pé. É que o congestionamento nos meios de transporte público está a pedir soluçöes urgentes.
Apertada feito sardinha em lata, no percurso pro trabalho, eu ia pensando na rodovia projetada para passar a oeste de Estocolmo, a tal da Förbifart, meu assunto favorito nos últimos tempos. Aquela mesma que, aliás, além de tema das Cartas de Estocolmo, foi motivo de programa televisivo recente, em que se apontaram todas as falhas na análise que levaram à falsa conclusão de rentabilidade positiva para o projeto.
Enquanto eu sofria com as agruras do transporte coletivo que tanto defendo, eis que entra no vagão em que eu viajava uma senhora loura e elegante, com um livro na mão.
Eu não podia entender o que ela fazia com aquele livro, apertada e tentando achar um lugar para colocar os pés no chão. Mas ela instalou-se na minha frente e, de pé e comprimida entre todos os corpos e bolsas, continuou calmamente sua leitura.
Não pude evitar estalar numa gargalhada. A senhora levantou o olhar questionador e eu, meio envergonhada pela minha reação espontânea, tive de explicar.
Disse-lhe então que, para mim, só na Suécia as pessoas liam no transporte coletivo daquela forma, apertados, tentando equilibrar-se entre curvas e freadas. A quantidade de livros de bolso que a população sueca lê a cada ano é inusitada. Todo mundo anda com um livrinho na mão e lê no ônibus, no metrô, no bonde e no barco.
E a senhora me respondeu, numa elegância ímpar, aparentemente sem dar bola às chacoalhadas ou a um cotovelo que teimava em ameaçar-lhe a leitura:
– Esta é uma forma de aproveitar o transporte, fazendo algo útil, dando um sentido ao tempo gasto na locomoção. Mas, na verdade, estou pensando em comprar livros em áudio, para ir escutando no mp3 no caminho para o trabalho…
Não há dúvida de que ela tem um bom argumento.
Eu também tenho outro argumento, só que para não ler nem andar com os fones de ouvido. É que, na linha do metrô e no transporte público, a gente tem muito a aprender. Mas, em lugar de ler livros, eu vou «lendo» as pessoas, observando seu comportamento, suas estratégias de sobrevivência, escutando as conversas.
De um jeito ou de outro, lata de sardinha sim, mas sempre aprendendo!
PS: Não resisti. A curiosidade foi grande: comprei meu primeiro livro em mp3. Chama-se «A arte de ser bonzinho», de Stefan Einhorn. Depois conto mais.
O in(f)verno
Taí um negócio que eu sempre pensei: por que, raios!, alguém haveria de cismar de morar num lugar tão inóspito como a Suécia, enquanto sobra terra nos trópicos? A Sandra Paulsen, minha colunista predileta do blog do Noblat também tem a mesma dúvida… Não perca o artigo dela de hoje, abaixo:
Natureza zangada?
Nos jornais suecos de hoje, a chuva e as mortes em Santa Catarina estão nas manchetes : «Catástrofe natural no sul do Brasil», dizia o Svenska Dagbladet, destacando o grande número de pessoas que morreram ou perderam suas casas.
Aqui, 75% dos velhinhos que moram sozinhos e dependem do serviço de assistência doméstica tiveram de se virar sozinhos. Acostumados a receber a visita de alguém que lhes dá os remédios ou cuida para que possam se alimentar, por exemplo, muitos ficaram sem a visita diária. E alguns que conseguiram ser atendidos só o foram devido à ajuda militar ou dos bombeiros, para abrir caminho e transportar os atendentes.
É que a neve começou a cair e, como sempre, ela é mais poderosa que toda a nossa tecnologia. E vêm mais tempestades de neve por aí, segundo a meteorologia.
O fato é que, quando começa a nevar pra valer, não há limpeza de rua que seja suficiente e o caos é quase inevitável. As ruas, sem a devida manutenção com areia, sal, etc., viram uma pista de sabão. Trens se atrasam ou não partem, carros deslizam, pessoas escorregam e ciclistas desistem das peripécias sobre duas rodas.
Os aviões não puderam decolar ou aterrizar dentro dos horários previstos em Arlanda e cerca de 50 mil passageiros foram afetados pelos atrasos.
Milhares de casas ficaram sem eletricidade, enquanto o tráfego de ônibus para Norrtälje, a cerca de 100 km ao norte de Estocolmo, foi totalmente suspenso. Nos arredores da capital, principalmente na área norte, a tempestade quase parou a população. Carros presos na neve (com pelo menos um caso fatal de morte por congelamento) e muitos acidentes foram a tônica. Em alguns lugares, como em Gotland, as escolas tiveram de fechar.
Uma colega me explicava que, há um par de anos, ficou para dormir no trabalho, já que não havia possibilidade de chegar em casa, a quarenta minutos do centro, e voltar no dia seguinte.
De vez em quando, principalmente em dias como o de hoje, eu me pergunto como é que nós viemos parar aqui. Um lugar onde o clima é tão duro e tão hostil que, mesmo com toda a tecnologia moderna (ou será por culpa dela?), as pessoas ainda são tão vulneráveis!
É uma sensação de impotência terrível, ao mesmo tempo que a pergunta fica no ar: será que a natureza está querendo nos dizer alguma coisa com tudo isso? De quem terá sido a idéia de estabelecer assentamentos humanos em latitudes tão longínquas, hein?
E o inverno está só começando…
Diferenças
Como é a viver num lugar praticamente sem luz do dia? Se você se interessa por esse tipo de coisa, não deixe de ler o artigo abaixo, da Sandra Paulsen (um dos poucos nomes que a Alta Direção deste blog não fala mal), colunista do Blog do Noblat:
Reflexos no escuro
No Brasil, temos a idéia de que, «em condições normais de temperatura e pressão», criança não fica na rua sozinha quando a noite cai, não é mesmo? Em novembro e dezembro, se a regra fosse aplicada à Suécia, criança ficaria em casa o dia inteiro! Ou quase!
É que, nesta época do ano, a escuridão é tal que a iluminação pública automática às vezes permanece acesa dia e noite, ou dia e dia, ou noite e noite, já que é tudo quase a mesma coisa.
É claro que estou exagerando nas tintas, mas a verdade é que, na típica escuridão do outono e do inverno suecos, é importante que as pessoas, principalmente as crianças brincando ou andando nas ruas, usem reflexos nas roupas. Imagino que vocês não sabiam disso.
Lembrei de falar dos reflexos porque li hoje no Brassar um artigo a respeito. O http://www.brassar.se é um portal de grande interesse para os brasileiros perdidos aqui no polo norte. Apresenta informações indispensáveis, notícias, curiosidades sobre a Suécia, para brasileiros radicados neste país ou para interessados em saber como é a vida aqui.
No artigo que li, a vibrante brasileira Joana Öberg, que idealizou e mantém o «site», fala justamente disso: da necessidade de comprar plaquinhas refletoras para as crianças andarem nas ruas.
Jo apresenta a questão, corretamente, como de vida ou morte, e conta sua experiência de «quase atropelamento» de uma pessoa adulta, que andava na beira do caminho sem os devidos reflexos.
Os reflexos estão presentes em sapatos, jaquetas, bicicletas e até na coleira dos cães que saem a passear com seus donos, também devidamente equipados com plaquinhas refletoras.
Pode parecer bobagem, mas não é não. Os reflexos são realmente um importante assunto no cotidiano daqui e dão margem a outras discussões ainda mais espinhosas. Como por exemplo, sobre a conveniência ou não de as crianças dos jardins infantis municipais usarem coletes ou jaquetas refletoras contendo publicidade e propaganda.
É isso mesmo. Diversas empresas deram-se conta de que os famosos coletinhos amarelos – usados por todas as crianças nas creches e escolinhas de Estocolmo no outono e no inverno – são fantásticos «postes de propaganda» móveis.
As empresas, então, doam coletes e jaquetas refletoras, com seu logotipo incluído, às escolas municipais. O supermercado Ica também fez sua campanha, no começo do outono, doando coletes a seus clientes-freqüentes. E as crianças saem portando logotipos «incandescentes» pelos jardins e parquinhos da cidade.
Uma importante companhia de seguros, por exemplo, defende o uso dos coletes infantis para propaganda, com a justificativa de que «para nós o que é importante é proteger as crianças e prevenir acidentes».
E os reflexos viraram tema político, em calorosas discussões entre oposição e situação no governo local.
Política e propaganda à parte, o fato é que não adianta querer ser chique. Por uma questão de segurança, a gente tem mesmo é que andar feito árvore de natal por aqui, nesta época do ano.
Lula gigante
Como é que surgiu um líder patético como o Hitler num país tão sério como a Alemanha? Mesmo na Itália, um país mais bizarro, um sujeito como o Mussolini no poder é estranho: como é que um italiano médio admite ser representado por um líder tão esquisito? Collor de Mello, Menem, Fujimori… Foram todos péssimos exemplos, mas não eram tão espalhafatosos como um Chavez, um Idi Amin Dadá ou um Jânio. O que me intriga e sempre me intrigou é: como um país aceita ter um líder notoriamente grotesco, que passa vexame sem constrangimentos? Fale o que quiser de um FHC, de um Gorbachov, de um Hiroito, mas essam sempre foram figuras comedidas, não personagens de circo. Falo isso no momento em que leio esse post no blog do Noblat, sobre o Lula. Acho que estamos assistindo à gênese de uma entidade folclórica como nunca antes se viu nesse país.
Burocracia de 1o. mundo é assim
Dificuldades com seu RG, CPF, número do título de eleitor, essepecesdossics & afins? Se fosse na Suécia, poderia ser pior, acredite. Saiba tudo sobre RGs suecos nenste excelente artigo da Sandra Paulsen, já rasgadamente elogiada neste prestigioso informativo internético:
Morto-vivo
Há coisas que a gente pensa que só poderiam acontecer em um país menos desenvolvido, carente de recursos e tecnologia. Mas, não. Essas coisas acontecem aqui também.
Conto a história…
Toda pessoa legalmente estabelecida na Suécia conta com um número pessoal. Esse é uma combinação entre a data de nascimento da pessoa e quatro dígitos que, além de fazerem daquela pessoa a única a contar com aquele número de identificação, também indica o sexo do dono ou da dona.
São dez dígitos não muito fáceis de decifrar, mas, por exemplo, se você é uma mulher nascida no dia 29 de fevereiro de 1984, então seu número pessoal será 840229-XXXX, onde o terceiro X será um número par, porque você é mulher (seria ímpar, caso estivéssemos falando de um homem nascido na mesma data).
Para quem mora aqui há muito tempo, o famoso «número pessoal» é a chave para ser atendido no serviço público, nos hospitais, nos consultórios médicos, na universidade, ou seja, praticamente em qualquer lugar. Você só não precisa do seu número pessoal se for tomar uma cervejinha no bar da esquina e pagar à vista. Se quiser pagar com cartão, no entanto, pode precisar se identificar e, aí, o famoso número entrará em cena.
Acontece que, a cada ano, há alguns casos de suecos ou residentes na Suécia erroneamente declarados mortos, seja por algum erro dos médicos nos hospitais, ou algum escorregão de alguém em uma repartição pública qualquer.
No ano passado, foram treze os casos e, neste ano, já são dez as pessoas erroneamente registradas como mortas.
O que acontece, então ? Quase sempre, advêm problemas econômicos, como subsídios governamentais que deixam de ser pagos, aposentadorias que não se recebem mais, etc. Mas o pior é quando acontece como na semana passada.
Um cidadão de 66 anos chega, passando mal, a um centro de assistência médica e, ao se apresentar, recebe o seguinte comentário de volta:
– Desculpe-me, mas o senhor já está morto.
Imaginem a cara do cavalheiro ao tentar, primeiro, de forma gentil, depois, já menos educadamente, é claro, explicar que estava vivo e necessitando de cuidados médicos urgentes!
O fato é que o cavalheiro foi-se embora sem ver o médico. E, como não podia deixar de ser, entrou com ação de perdas e danos morais contra o Estado.
E eu pensando que era só no Brasil que pessoas tinham seus CPFs clonados e ficavam com nome sujo na praça, sem ter nenhuma culpa no cartório… Não reclamo mais! Posso estar com o CPF sujo na praça, mas pelo menos ninguém me declarou morta, ainda…
Truques de marketing que você não conhece
Você sabe como é o dia-a-dia na Suécia? Se você fosse um dos leitores dos posts da Sandra Paulsen, regularmente publicados no blog do Noblat, saberia. O de hoje fala dos truques que algumas lojas e supermercados de lá utilizam que ninguém conhece em Pindorama. Vale a pena ser lido:
Ética da sociedade de consumo
Além da publicidade e da propaganda, normalmente utilizadas, são conhecidas outras táticas menos explícitas das quais o comércio, algumas vezes, lança mão para atrair clientes: a famosa «boa aparência» exigida na contratação de vendedores, por exemplo, é um clássico. Meninas e meninos bonitos atrás do balcão ajudariam a aumentar as vendas.
Só que algumas recentes chamadas em jornais locais, sobre as estratégias de certas empresas para atrair consumidores, vêm-me deixando de cabelos em pé. Parece que a baixa conjuntura e as ameaças de recessão econômica estão fazendo o comércio varejista de Estocolmo se desesperar.
Primeiro, uma notícia de que os portadores do cartão da rede de supermercados Ica recebem ofertas especialmente para eles, preparadas de acordo com as compras feitas com o cartão. Ou seja, aqueles que compram batatas fritas, sabão em pó e comida para gatos recebem ofertas pessoais específicas relacionadas a esses produtos. As compras feitas pelos consumidores são registradas e estudadas, para dar origem a ofertas sob medida. A repercussão da notícia ainda não é clara. Enquanto uns sentem que, por fim, receberão ofertas interessantes que poderão ser aproveitadas, outros acham que esse tipo de propaganda constitui invasão de privacidade.
Depois, uma nota a respeito de lojas que empregam pessoas especialmente para fingir que compram e para circular com suas sacolas cheias de produtos, como forma de propaganda. São clientes de mentirinha, que se comportam como consumidores vorazes, para provocar o interesse de outros compradores e aumentar as vendas. Estabelecimentos do comércio de Estocolmo recrutam atores para esse papel de falsos clientes, os quais, entre outras atribuições, também distribuem elogios a clientes de verdade que experimentam peças nos provadores das lojas.
Agora, a última das novidades vem também dos supermercados Ica. A cadeia ficou com uma fama negativa no ano passado, por vários casos de adulteração das datas de validade da carne moída à venda. Houve punições, mudanças nos procedimentos, e a história está praticamente esquecida. Só que agora o Ica estaria testando um novo método para aumentar seus ganhos: «perfumar» artificialmente as áreas onde se vendem frutas e verduras. Com o cheirinho artificial de manga, banana ou pêssego fresco, «fabricado» sinteticamente e devidamente espalhado por um ventilador que fica embaixo da prateleira de frutas de uma das suas lojas em Malmö, o Ica espera atiçar os fregueses a comprar mais.
Eu me pergunto se sou só eu a ficar de queixo caído. Até que ponto o comércio pode chegar para aumentar suas vendas? Não bastam as táticas para estimular a compra por impulso, os chocolates no caixa, os produtos mais necessários estrategicamente colocados para que as pessoas tenham que passear a loja inteira até encontrá-los, e outras coisas assim?
Quando me assusto muito com o consumismo e as técnicas para estimulá-lo, tento pensar no argumento freqüentemente utilizado pelos admiradores incondicionais do Estado de Bem Estar sueco: aqui as coisas ruins se sabem; em outros lugares, se escondem.
Tomara que seja assim mesmo.
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