Sindicalistas-celebridade
Neste post, comento o trabalho de pesquisadores dos EUA sobre os executivos-celebridade, que jogam muito mais no time deles mesmos do que no da empresa. O estudo mostra que esses executivos, embora muito bons em obter altos rendimentos para eles próprios, não são tão bons assim para as empresas que os contratam. São precisamente estes os casos dos executivos das AIGs da vida, que tanta polêmica estão causando atualmente nos EUA.
Ocorre que, do outro lado do balcão, entre os operários, também acontece efeito semelhante. O Reinaldo Azevedo comentan hoje em seu blog: “Almocei, não faz muito tempo, com um empresário que integrava o famoso Grupo 14 da Fiesp, quando Lula era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo. Ele me contou das conversas animadas que o Grande Líder mantinha com a “craçe dominânti”, mediadas por um bom uísque 12 anos. Acertavam-se ali os passos da radicalização e do acordo possível — incluindo greve, gritaria, passeata e tudo mais”. O que o Reinaldo quer dizer é que o Lula (e, justiça seja feita, não foi só o Lula que agiu/age assim, essa é a regra entre os sindicalistas-celebridade) se comportava, quando sindicalista-celebridade, exatamente igual aos executivos-celebridade da pesquisa acima referida, agindo em favor de seus próprios interesses, e iludindo seus patrocinadores – no caso dos sindicalistas, os trabalhadores; no caso dos executivos, os acionistas.
Celebridades, sejam elas executivos ou sindicalistas, são, antes de tudo, agentes econômicos racionais, que tentam maximizar seu resultado individual. É a mesma coisa que acontece com as celebridades propriamente ditas (atores, apresentadores de TV, jogadores de futebol, etc.): o Fausto Silva, a Xuxa e o Tarcísio Meira jogam no time deles, não no na Globo, assim como o Ronaldinho não morre de amores pelo Corinthians. A diferença é que os sindicalistas-celebridade precisam dar contornos ideológicos ao seu discurso para convencer os trabalhadores de que eles são a melhor opção para os representarem – justamente por serem celebridades, esses seres mágicos. É muito parecido com o que ocorre entre os executivos-celebridade e os acionistas, embora a ideologia em questão seja diametralmente oposta.
Já temos nosso primeiro Nobel
No final desse ano, teremos uma barbada nas indicações do Prêmio Nobel: nosso estimado presidente Marolinha, que acha que, por ter 84% de aprovação popular, tornou-se automaticamente um gênio. Pelo menos, é o que se espera ao ler essa matéria do Financial Times, publicada no BGrasil pelo UOL/BBC:
Lula diz no ‘FT’ que quer mundo livre de dogmas econômicos
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse esperar um mundo mais “humano” após a eventual recuperação da economia mundial em um artigo exclusivo na página de opinião do jornal “Financial Times” desta terça-feira.
Em artigo exclusivo ao jornal Financial Times, Lula disse esperar um mundo mais “humano” após a eventual recuperação da economia mundial
“Não estou preocupado com o nome que será dado à nova ordem econômica e social que virá depois da crise, desde que seu principal foco seja o ser humano”, diz Lula no jornal.
O texto faz parte de uma série de debates e artigos promovida pelo diário britânico sobre o futuro do capitalismo.
“Hoje ninguém ousa prever qual será o futuro do capitalismo”, afirma Lula. “Como líder de uma grande economia descrita como ‘emergente’, o que posso dizer é que tipo de sociedade espero que apareça depois desta crise… Tenho esperanças de um mundo livre dos dogmas econômicos que invadiram as ideias de muitas pessoas e que foram apresentados como verdades absolutas.”
“Políticas anti-cíclicas não deveriam ser adotadas apenas em épocas de crise. Aplicadas com antecedência – como foi feito no Brasil – elas são a garantia de uma sociedade mais justa e democrática”, escreve o presidente.
Lula ainda descreve outras expectativas que tem para o fim da atual crise econômica global.
“(Espero que surja) uma sociedade que vai valorizar a produção e não a especulação. A função do setor financeiro será de estimular a produtividade – e ele estará sujeito a um controle rigoroso nacional e internacional. O comércio exterior será livre do protecionismo que está mostrando sinais perigosos de estar se intensificando”, diz.
Lula também menciona suas esperanças de uma reforma nas organizações multilaterais e de um novo sistema de governança global.
Em boa parte do artigo, o presidente também relembra sua infância no interior de Pernambuco, o início de sua vida de metalúrgico em São Bernardo do Campo (SP) e sua trajetória política até ser eleito em 2002.
“Para mim o capitalismo nunca foi um conceito abstrato”, escreve.
Porque sou um “otimista racional”
Desculpem pelo post autobiográfico, mas a melhor forma que eu encontrei para explicar o momento atual é revivendo os últimos vinte e poucos anos, desde que “virei gente” (i.e.: saí da alienação adolescente – pelo menos, a mais aguda). Entrei na faculdade (FEA-USP) na época do Plano Cruzado, que é quando começa a se delinear o cenário que hoje vivemos. Era uma época esquisita: não houve bife por um bom tempo no bandejão da universidade porque a carne sumira do mercado, e a gente tomava vodca porque a cerveja também desaparecera – um prosaico churrasquinho com uma gelada dependia de contatos obscuros, com o cuidado de não despertar a atenção de nenhum “fiscal do Sarney”. Estava tendo aula de Introdução à Economia II quando a bolsa de N.York quebrou, em 1987, o que de certa forma foi um privilégio acadêmico. Em 1989, a inflação era tão alta que existia um produto bancário chamado “pagamento de impostos”, que nada mais era do que… Pagamento de impostos, mas com um “rebate” para o pagador. Por exemplo: a empresa ABC recolhe um milhão de dinheiros no caixa do banco tal. Acontece que, como esse banco tal demorava X dias para repassar o dinheiro para o Tesouro, havia um “floating“, uma espécie de prazo para o banco pagar. O overnight pagava coisa de 2%a.d. ou mais (veja bem: ao dia, não ao mês). Na maioria dos casos, o floating era superior a cinco dias, algo como 10-15%% pelo período, e 10-15% de muita grana era muita grana também. Para uma empresa que paga um milhão de ICMS, o lucro bruto é de R$100-150mil, um valor que podia ser “rebatido” (dividido) entre o banco e o cliente. Olha que época absurda…
A hiperinflação fazia com que a economia ficasse surreal, mas nada se compara a bizarrice de 1990, com o Plano Collor (e o próprio), a Zélia, o Ibrahim Eris, o PC Farias, um pessoal muito, mas muito estranho mesmo. A primeira coisa que o ex-presidente Fernando Collor fez (ou uma das primeiras) foi decretar feriado bancário. Trabalhava no Citibank na época, e houve expediente interno, a maior parte passada na frente da TV, assistindo às explicações das “torneirinhas” do bloqueio de Cruzados Novos. O governo simplesmente tomou a maior parte do dinheiro de todo mundo, é possível um negócio desses? Logo depois, o plano fracassa, a inflação dispara, a credibilidade do governo vira pó, as reservas do país desaparecem, e o Fernandinho acaba impeachado (ou seria impichado?). A seguir, toma posse o Itamar, que faz beicinho para ressuscitar a produção do Fusca… Imagine o que é um presidente ficar dando pitaco em lançamento de produto, que coisa mais esquisita. Chega 1994 e, no meio dele, um plano mirabolante, que dolarizava a economia com uma moeda virtual (URV, lembram?), e depois desdolarizava convertendo tudo a uma taxa de 2,75:1 (!!!). Por ironia, esse plano fantástico se chamou Real.
No resto dos anos 1990, até 2001, de tempos em tempos estouravam crises internacionais: crise do México, crise dos Tigres Asiáticos, crise da Rússia, a crise cambial brasileira de 1999 (uma crise doméstica com contornos de crise internacional), o estouro da bolha da internet e, finalmente, a crise decorrente dos ataques de 11 de setembro de 2001. De 2002 até o início de 2008, entretanto, fora a balbúrdia na transição FHC-Lula (que nem foi tão dramática assim), vivemos um período excepcionalmente calmo na economia, tão calmo que deu até tempo para discutirmos Ecologia. Mas eis que a crise dos subprimes emerge em 2008, os bancos acabam contaminados, as commodities idem, o crédito e a sua prima, a confiança, desaparecem, e o resultado é a atual crise financeira, que em 2009 está com a corda toda. Será o fim do capitalismo? O sistema financeiro global está condenado à extinção? Ou essa é só mais uma das tantas crises tão comuns outrora, mas que nos desacostumamos a passar?
Certamente não estamos atravessando uma marolinha, mas também não há dúvidas que já vivemos momentos bem piores no passado “recente” (vamos considerar como recente o período do governo Sarney para cá). Como o grande problema que a maior parte do mundo está vivendo tem a ver com os bancos – que, no Brasil pós PROER, são razoavelmente sólidos -, o país está sendo impactado principalmente pela queda no valor das commodities que produzimos, e pelo encolhimento do mercado comprador externo. Lógico que também sofreremos por outros fatores, como as dificuldades por que as multinacionais instaladas aqui deverão passar em suas respectivas matrizes, o calote que tomaremos em nossas exportações, os problemas pelos quais a Petrobras deverá passar devido à depressão no preço do petróleo etc., mas nada de bancos quebrando em massa, descrença no sistema financeiro, e calamidades do gênero.
Na verdade, para um brasileiro é muito menos arriscado acreditar no futuro do que duvidar dele. Como a chance do Brasil se sair melhor que a média dos outros países é muito alta, a turma dos otimistas tem maior probabilidade de se dar bem que a dos pessimistas. Admitindo que o que conta é o sucesso relativo e não o absoluto, perder uma oportunidade (ganhar pouco quando todos os outros ganham muito) é tão danoso quanto entrar numa roubada (perder quando os outros ganham pouco). Por isso, no cenário atual, as apostas otimistas estão pagando muito mais que as pessimistas. Você pode não gostar do presidente Lula, pode achar que o otimismo é uma praga ingênua, sua visão sobre o mundo pode ser sombria até por questões psicológicas, mas se pensar bem vai concluir que a postura otimista é a melhor atualmente em termos racionais.
Herança maldita
Se o PIB cresce 2% ou 5%, se a inflação está no “centro da meta” ou se ficou 3% acima, se a taxa SELIC caiu ou subiu, tudo isso se desmancha no ar: daqui a alguns anos, nada disso terá importância real para o Brasil. Mas existem coisas que não serão esquecidas tão cedo, que impactarão o país por gerações, e que serão fundamentais para a nossa permanência como país subdesenvolvido. Uma delas é a nossa postura perante o mundo: a não-extradição do terrorista italiano, a extradição dos atletas cubanos, e o namoro com as FARC são, dentre outras, coisas que demorarão décadas para serem resolvidas. Mesma coisa quanto ao inchaço da máquina estatal e ao assistencialismo bolsafamiliar, estes um pouco menos difíceis de desmontar. Mas o que realmente irá assombrar o Brasil por gerações é o símbolo da ignorância representado pelo presidente Lula. É o que explica com brilho incomum o psicanalista Renato Mezan na Folha de ontem:
Não lê por quê?
Desdém do presidente pela leitura, que não se justifica pelas origens humildes, presta um desserviço ao Brasil
Uma frase dita pelo presidente Lula em sua entrevista à revista “Piauí” deste mês vem dando o que falar: não é por falta de tempo que não lê blogs, sites, jornais ou revistas, mas porque tem “problema de azia”.
A observação provocou reações de jornalistas e colunistas, e é provável que tenha causado mal-estar na comunidade acadêmica, assim como entre os brasileiros com maior nível cultural.
Nenhuma ideia pode ser examinada sem referência ao seu contexto. O presidente não estava falando das virtudes ou malefícios da leitura em geral, mas apenas do efeito que tem sobre ele o noticiário, em especial o político; assim, seria descabido inferir do que disse uma suposta opinião negativa da sua parte sobre o ato ou o costume de ler.
Contudo, nos parágrafos seguintes à declaração -que também delimitam o contexto dela-, fala do seu lazer: ora, se deste fazem parte “pescar, jogar cartas, conversar”, brilha pela ausência qualquer menção à leitura de livros e, igualmente, a qualquer outra atividade cultural.
Dirá o leitor que isso se deve à sua origem humilde? Além de ser uma generalização indevida, tal explicação deixa de lado o fato de que muitas pessoas nada abonadas frequentam shows, veem filmes de apelo popular, visitam exposições divulgadas pela mídia ou vão ouvir música erudita, quando essas coisas são oferecidas a preços que cabem no seu bolso ou mesmo gratuitamente.Horas na fila Que o diga quem esperou horas para entrar na exposição de Rodin, espremeu-se nas filas de “Dois Filhos de Francisco” e “Tropa de Elite” ou se dispõe a enfrentar a multidão que acorre ao parque Ibirapuera para ouvir as orquestras estrangeiras que de vez em quando se apresentam no parque.
Atenhamo-nos, porém, ao capítulo livros. É certo que alguém pode se informar pela televisão ou por resumos preparados por assessores sobre assuntos de interesse dos seus chefes -metade da matéria da revista é dedicada a Clara Ant, que faz esse trabalho para o presidente. Mas nem briefings nem meios eletrônicos podem substituir o livro, e isso por ao menos duas razões. A primeira é que ver imagens ou ouvir alguém falando põe em jogo capacidades psíquicas diferentes das requeridas para lidar com um texto longo.
Além de concentração muito maior, a extensão de um livro comum torna impossível apreender seu conteúdo de uma única vez.
O hábito de ler favorece portanto a retenção de dados e treina a memória para reconhecer e acessar, entre seus inúmeros arquivos, aqueles que permitem estabelecer continuidade entre o que se leu antes e o que se está lendo agora. A segunda é que, como contém num volume reduzido um enorme número de informações, o livro possibilita, no trato dos seus temas, uma abrangência que nenhum artigo ou vídeo pode igualar.
É o espaço do debate entre ideias complexas, do relato minucioso, da descrição precisa do que o autor julga importante comunicar.
Isso permite o trânsito entre níveis diferentes de abstração, entre o detalhe e o quadro do qual faz parte, entre os elementos isolados e a síntese que lhes dá sentido.Um mau modelo Mas não é por essas qualidades dos livros que lamento a ausência deles no cotidiano de Lula. É porque, com a influência que têm suas palavras e atitudes, o fato de não demonstrar o menor interesse pela palavra impressa transmite uma mensagem nefasta a quem nele confia e nele se espelha. Todos sabem que é um excelente comunicador: se insistisse na importância dos livros, se utilizasse em suas falas exemplos e referências tirados do que leu, podemos estar certos de que isso teria efeito benéfico sobre os milhões de brasileiros que passam anos, ou a vida inteira, sem jamais segurar nas mãos um volume, quanto mais abri-lo e se inteirar do que ele contém.
O presidente já disse muitas vezes que não ter estudado não o impediu de chegar aonde chegou. Eis outra frase infeliz: não é porque teve parca instrução formal, mas apesar dessa falta, que obteve seus sucessos. Ao mencioná-la como se fosse algo positivo, contribui -mesmo que não seja essa a sua intenção- para desprestigiar ainda mais tudo o que está ligado à educação. A situação calamitosa do ensino no Brasil em nada melhora quando o modelo identificatório que o presidente Lula representa para tanta gente sugere nas entrelinhas que estudar não é necessário.
Essa atitude blasée, ao contrário, me parece particularmente perniciosa para os jovens, muitos dos quais, por razões que não cabe aqui explicitar, têm atualmente pela leitura uma aversão que beira a fobia. O que está em jogo aqui não é a visão utilitária segundo a qual o estudo é o caminho da ascensão social, mas a importância dele (e da leitura) para criar cidadãos menos permeáveis à manipulação pelos órgãos de informação, da qual o próprio presidente se queixa na entrevista.
Diz Lula que é admirador de Barack Obama e crítico contundente de George W. Bush. No entanto o descaso com os livros e com o que eles significam o aproxima deste, e não daquele. Uma das pérolas proferidas pelo texano foi endereçada aos estudantes da universidade em que se formou (Yale) e na qual teve desempenho medíocre: “Vocês, alunos que tiram C, também podem pretender ser presidentes dos EUA”.
Em contraste, Obama -que em seus tempos de Harvard dirigiu a revista da Faculdade de Direito- tem o maior respeito pelos livros, graças aos quais pôde adquirir uma sólida base intelectual para suas convicções progressistas.
Só carisma não resolve Sem a frequentação deles, não teria podido citar em seu discurso de posse a Bíblia e palavras de George Washington, não saberia se servir das alusões e metáforas que abrilhantaram sua fala nem demonstraria o seguro conhecimento da história do seu país, assim como da situação de povos estrangeiros, que evidentemente possui. É certo que sem seu carisma e sem a habilidade retórica que soube desenvolver nada disso teria produzido o entusiasmo que se viu, mas também seria tolo negar que a qualidade literária e a construção caprichada do discurso têm algo a ver com o efeito que teve mundo afora. E não se objete que foi redigido por assessores: no dia seguinte, os jornais davam conta de que foi o próprio Obama quem estabeleceu o roteiro básico e deu ao texto a última demão de tinta. Lula não é o tabaréu que alguns pretendem (o jornalista Mario Sergio Conti, a quem ele concedeu a entrevista, diz que o site da revista “Veja” na internet o mima frequentemente com o epíteto de apedeuta, que significa ignorante).
Mas é certo que, se tivesse um pouco mais de apreço pela letra de forma, evitaria meter-se em algumas situações constrangedoras e faria um grande bem ao povo “deste país”.
O poder do Marolinha
No começo da atual crise econômica mundial, Lula minimizou-a com a célebre frase da marolinha. Dúzias de declarações otimistas depois, o resultado é que o Brasil é o segundo país mais otimista do mundo quanto à crise – veja mais aqui, no G1. O fato é que, mais uma vez, o Lula deu mostras de seu poder de persuasão. Não é à toa que o hómi está com quase 80% de aprovação…
Papai Noel
Eu me lembro perfeitamente quando descobri que Papai Noel não existia. Tinha uns 5 ou 6 anos, e estava no cinema num domingo de manhã (na época, havia sessões de cinema para crianças aos domingos de manhã, era a “Sessão Zig-Zag”), assistindo ao Canal 100 (noticiário que passava antes dos filmes) com meu primo. Como ele era uns 4 anos mais velho que eu, já sabia da farsa natalina há tempos, e resolveu me sacanear: “Você sabe que essa história de Papai-Noel é mentira, né?”. Lógico que não dei o braço a torcer, e embora estivesse chorando por dentro, disfarcei e fingi que já sabia que Papai Noel era uma fantasia, mas foi um choque para mim, um baita choque. (O interessante é que, hoje em dia, esse mesmo primo é um sujeito extremamente místico, já tendo morado, inclusive, em uma comunidade do Santo Daime por diversos anos, no meio da floresta, ao passo que eu sou o extremo oposto, um sujeito de um ceticismo muitíssimo arraigado – mas essa é uma outra história).
Se você quiser ler uma outra crônica sobre o Papai Noel e os mitos de Natal, não perca o excelente texto abaixo, da Altenéia Feijó, direto do blog do Noblat:
E se Papai Noel existir?
Nos meus tempos de criança só ganhava presente de Natal quem acreditasse em Papai Noel. Então a gente escrevia (ou ditava) carta, prometia se comportar bem e fazia um pedido dando várias opções para o presente. Eu só pedia o que estava dentro das possibilidades da minha família. Quem disse que não há intuição ou sabedoria infantil? Ah, antes de me deitar, deixava um sapatinho perto da janela aberta do quarto e tentava ficar acordada a fim de flagrar a chegada do bom velhinho. Aí minha mãe me explicava que, enquanto eu não adormecesse, ele não viria. Depois, quando já não acreditava mais na lenda, fingia dormir para meu pai continuar colocando um brinquedo novo no meu sapato.
Um belo dia, muitos anos após, chegava eu do trabalho quando meu filho, na época com 6 anos, me cercou e foi direto na pergunta:
– Mamãe, Papai Noel existe de verdade?
– Enquanto você acreditar nele, existe!
– Vou continuar acreditando…
Hoje, em quase cada esquina comercial dá para avistar uma figura humana fantasiada de Papai Noel. Banalizou-se o lendário bom velhinho. Quem diria, transformou-se em figuração remunerada. E nada de espantos porque isso faz tempo. A notícia é que neste fim de ano os shoppings brasileiros contrataram 700 pessoas em todo o país para trabalhar como papais noéis. Segundo a Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), alguns podem ganhar até R$ 8 mil durante a temporada. Sim, a remuneração se diferencia por vários e interessantes aspectos. Por exemplo: ganha um cachê mais alto quem tiver uma barba branca verdadeira e bem cuidada, melhor desempenho na encenação e empatia. Além disso, existem cursos para preparar candidatos, ensinando-lhes técnicas de maquiagem, como compor e vestir a fantasia, como tratar as crianças e algo mais.
Na realidade, se não houver um certo talento, em vez de atrair e encantar os pequenos o Papai Noel contemporâneo pode assustá-los. Afinal, apesar de ter virado uma atividade no mercado de trabalho, sua figura precisa continuar tendo algum apelo lúdico. Nos shoppings essa preocupação é mais explícita. Sem conseguir escapar da competição capitalista, papais noéis se esforçam para se manterem “ludicamente” atraentes. Isso é ruim? Não. Pelo menos é um trabalho temporário bem remunerado, favorece a criatividade, agrada consumidores adultos e a criançada.
A origem do bom velhinho embasada na história do bispo São Nicolau que presenteava crianças por gosto, na região da atual Turquia, quase ninguém mais conhece. No século XVII a lenda foi levada pelos holandeses para os Estados Unidos. Aí, em 1931, a Coca-Cola realizou uma campanha publicitária na qual o artista Habdon Sundblom remodelou a imagem do Santa Claus (o São Nicolau). Tornou-o bonachão e comunicativo. Mais. Substituiu sua roupa de inverno marrom pelo vistoso traje vermelho. Deu certo. Agora, com esta crise mundial, parece desejo do presidente Lula que se invente um Papai Noel brasileiro. Bem… Se a gente quiser acreditar… Ho, ho, ho.
Bola dentro!
Pela 2a vez na semana, o Clóvis Rossi dá uma bola dentro – o que faz desta, uma das melhores em desempenho do colunista da Folha nos últimos 10 anos, pelo menos (de acordo com a memória do editor deste blog, que também não é aquela beleza toda). Bem, resumindo: o artigo de hoje (abaixo copiado) vale a pena ser lido. (Somente uma correção: a rigor, nem o Meirelles nem o Lula têm autonomia plena para ditar a taxa Selic, que é definida por um comitê com poderes para tal, o COPOM).
Quem preside, Lula ou Meirelles?
De Luiz Inácio Lula da Silva, em mais uma das cerimônias-comício em que é especializado, no dia 2, em Recife: “Todo mundo sabe que temos uma taxa de juros acima daquilo que o bom senso indica que deveríamos ter”.
Cabe explicar ao leitor distraído que Luiz Inácio Lula da Silva vem a ser o presidente da República, eleito em 2002 e reeleito em 2006.
Nessa condição, cabe a ele indicar todos os ministros e também o presidente do Banco Central, a instituição que estabelece a taxa de juros que está “acima daquilo que o bom senso indica”.
Em um país normal, quem faz o que o chefe acha “insensatez” é demitido liminarmente, sem direito a indenização.
Aliás, esta Folha publica mensalmente, faz um bocado de tempo, um texto que, com pequenas variações, afirma que “Lula pressiona Banco Central por queda na taxa de juros” (foi o título mais recente da série, dia 4). Periodicamente, o BC dá uma solene banana às “pressões” de Lula -e não acontece nada. Nem Lula renuncia por ser desautorizado por um subordinado, nem demite o presidente do banco.
Ainda por cima, vem a corrente majoritária do PT, supostamente o partido do governo, e ataca frontalmente o BC como “último bastião da ortodoxia”, como se o presidente do BC tivesse dado um golpe e se sentado na marra na cadeira, em vez de ter sido nomeado por Lula (aliás presidente de honra do PT) e por ele mantido no cargo por seis anos, mesmo sendo supostamente tão desobediente e “insensato”.
Seria tudo muito ridículo não fosse o seguinte fato da vida: Lula terceirizou a política econômica para Meirelles, que faz o que bem entende com os juros. Foi a maneira que encontrou de acalmar as piranhas do mercado financeiro, as únicas que podem desestabilizar um governo que não lhes dê o sangue que pedem insaciavelmente.
Os bons tempos estão acabando…
…Tanto para Bush, que vai direto da Casa Branca para a Casa do C&%R@%?O, quanto para o Marolinha, que vai ter que rebolar para brilhar com o Obama na presidência.
Subserviência
Sempre que achei que o presidente tinha dito alguma coisa arriscada eu estava errado e ele estava certo. – Ministro Tarso Genro, hoje, sobre seu chefe
E a marolinha, hein!? Já tá dando prá pegar jacaré.
Pelo menos é o que diz o Alexandre Schwartsman.
Mas não dê bola para o Alex, não… Ele é um economista a serviço do capital estrangeiro. Seja patriota e acredite em nosso presidente: corra já prá comprar sua TV de plasma em 120 parcelas neste Natal, que vai ser o melhor da história desse país.
E aí presidente? Como você explica isso?
Enquanto o nosso presidente Luís Inácio Marolinha da Silva passeia pelo mundo em seu Airbus, nossas crianças continuam morrendo: o Brasil é o 3o pior país em mortalidade infantil na América do Sul, só ganhando da Bolívia e do Paraguai. O que seria inaceitável é, nesse caso, um absurdo, vindo o Lula de onde veio (filho de uma mãe que “nasceu analfabeta”, ele mesmo poderia ter morrido ainda bebê). Mas tudo bem, tenho certeza que o PAC vai resolver também este problema, e que em 2010 nosso país apresentará índices de mortalidade infantil escandinavos.
Lula gigante
Como é que surgiu um líder patético como o Hitler num país tão sério como a Alemanha? Mesmo na Itália, um país mais bizarro, um sujeito como o Mussolini no poder é estranho: como é que um italiano médio admite ser representado por um líder tão esquisito? Collor de Mello, Menem, Fujimori… Foram todos péssimos exemplos, mas não eram tão espalhafatosos como um Chavez, um Idi Amin Dadá ou um Jânio. O que me intriga e sempre me intrigou é: como um país aceita ter um líder notoriamente grotesco, que passa vexame sem constrangimentos? Fale o que quiser de um FHC, de um Gorbachov, de um Hiroito, mas essam sempre foram figuras comedidas, não personagens de circo. Falo isso no momento em que leio esse post no blog do Noblat, sobre o Lula. Acho que estamos assistindo à gênese de uma entidade folclórica como nunca antes se viu nesse país.
Lula & preconceito
Raramente escrevo artigos históricos, mas este aqui é uma exceção, publicado na Você S/A logo antes do Lula tomar posse em seu primeiro mandato:
O preconceito do preconceito
Pela primeira vez na história, temos um presidente de origem popular. Lula é nordestino, sem formação acadêmica e portador de uma mutilação física. Se FHC diz ter um “pé na cozinha”, Lula tem os dois na senzala. Com todos estes atributos, Lula é igual à maioria dos presidiários, bóias-frias, porteiros de prédio e pedreiros do país. Em outras palavras: temos um Presidente da República que teria problemas para entrar em um restaurante fino de São Paulo – não fosse ele, obviamente, o morador do Palácio da Alvorada. Acredito que chegou a hora de encararmos de frente o preconceito e a discriminação que fingimos não ter. Temos, sim. Todos nós. Segundo a Biologia Evolutiva, o ser humano é um animal preconceituoso e discriminatório por natureza. Essas características foram essenciais para nossa evolução e são impossíveis de serem extirpadas, a não ser que se desenvolva uma técnica de cirurgia genética.
Existe uma antiga anedota sobre o namoro da Xuxa com o Pelé. A então jovem modelo chegou em casa e falou que estava namorando um negro. O pai, escandalizado, arrancou os cabelos por isto; sua mãe quase desmaiou. Mas quando a Xuxa disse que o negro era o Pelé, seu pai disse: “Ah, filha! Mas o Pelé não é tão negro assim!”. Da mesma forma, a maioria dos eleitores brancos e educados do sudeste que votaram no Lula provavelmente não o consideram tão nordestino, retirante e iletrado assim. Daí a grande idéia do seu marketeiro de vendê-lo como “Lula Light” ou “Lulinha Paz e Amor”. A mensagem subliminar para a classe média é a de que o Lula é ex-nordestino, ex-operário, ex-iletrado. Ou, visto por outro ângulo, o Lula agora é “um dos nossos”.
Vamos entender o preconceito pelo começo. Nossos antepassados não tinham uma vida tranqüila. No início da nossa existência como espécie, os Homo sapiens, agrupados em pequenas comunidades de caçadores-coletores, viviam em guerras tribais. A escassez de alimentos nas estiagens era devastadora e a equação básica da sobrevivência – representada pela quantidade de alimento dividida pela população – só fecharia se o denominador fosse reduzido. Visto de outra forma: se não houvesse guerra e morticínio, todos morreriam de subnutrição. Por outro lado, era preciso identificar claramente os componentes de sua própria tribo. Para que fosse possível saber a que tribo um indivíduo pertencia, era essencial discriminar. E nós desenvolvemos habilidades específicas de reconhecimento através das características físicas, como a cor da pele, por exemplo.
Como o traço comportamental de cooperar com quem é da mesma tribo e desertar com quem for da tribo vizinha trouxe vantagens evolutivas para nossos ancestrais, este comportamento se perpetuou na nossa espécie. Todos nós sempre discriminamos toda pessoa que vemos pela frente. Isto é tão natural quanto nossa boca salivar ao sentir cheiro de churrasco. Sempre que somos apresentados a alguém, nosso cérebro trabalha freneticamente para enquadrar esta pessoa em algum estereótipo que nos faça sentido. Uma grande gama de informações é checada em poucos segundos: da cor da pele ao formato do nariz; do sotaque à construção gramatical; dos gestos à vestimenta, nada escapa ao cérebro humano, construído e treinado para discriminar.
Devido a isto, nossa espécie tende a achar que todos que são diferentes de seu grupo étnico são, a princípio, inimigos. Este comportamento fazia sentido há 50.000 anos – na verdade, era determinante para a sobrevivência. Mas na sociedade moderna, este mesmo comportamento leva a distorções gravíssimas. Sobram exemplos do lado perverso do comportamento discriminatório. Os alemães da década de 30 achavam que os culpados de tudo eram os judeus. Muitos sulistas do Brasil acham que os culpados pelo desemprego e pela violência são os nordestinos. A maioria dos judeus israelita acha que os palestinos são uma praga a ser dizimada. Os brancos sul-africanos achavam que os negros nativos eram uma sub-raça, e assim por diante. Por ironia, a espécie humana é uma das que apresenta menor variação genética entre as espécies animais. Em essência, é um erro pensar que nós nos dividimos entre negros, pardos, brancos ou amarelos. O ser humano é uma raça única.
Na sociedade atual, organizada em supertribos multi-étnicas, o traço comportamental discriminatório ainda faz sentido em determinadas situações. Se, por uma mutação genética, alguém nascesse sem este traço comportamental, provavelmente esta pessoa teria problemas sérios. Um bom exemplo seria se esta pessoa estivesse andando pela rua de madrugada e encontrasse com uma gang de trombadinhas. Uma pessoa desprovida do sentimento discriminatório não saberia que seria assaltada ou agredida, ao passo que uma pessoa normal fugiria ou se esconderia do perigo. Mas o lado perverso da discriminação também existe e, apesar de “natural”, deve ser combatido. Com a eleição do Lula, acho que demos um passo importante para diminuir o preconceito, pois agora temos uma referência clara de que quem é pobre, nordestino e fala errado também pode chegar lá!
A frase, a imagem
Toda crise tem solução. A única que eu cheguei a pensar que não tinha, a do Corinthians, acaba de se resolver. – Luís Inácio Marolinha da Silva, hoje
Luís Inácio Marolinha da Silva
Vamos ter um forte impacto na atividade econômica, na economia real, e no mundo todo vai desacelerar e isso está ficando nítido agora (Guido Mantega, hoje)
Melhores frases de Lula sobre a crise:
30 de março de 2008:”Bush, meu filho, resolve a sua crise”
17 setembro 2008: “Que crise? Pergunta para o Bush”
29 de setembro de 2008: “O Brasil, se tiver que passar por aperto,será muito pequeno”
30 de setembro de 2008:”A crise é muito séria e tão profunda que nós ainda não sabemos o tamanho”
22 de setembro de 2008:”Até agora, graças a Deus, a crise não atravessou o Atlântico”
4 de outubro de 2008:”Lá, a crise é um tsunami. Aqui, se chegar, vai ser uma marolinha, que não dá nem para esquiar”
Olhos de vidro de um banqueiro
Poucas profissões são mais estigmatizadas que a de banqueiro, sempre retratado como uma figura mesquinha, gananciosa e desalmada – Shylock (personagem central de “O mercador de Veneza”, de Shakespeare) que o diga. Banqueiros são o paradigma do materialismo por definição, de quem jamais se pode esperar atitudes altruístas.
Apesar disso não ser novidade para ninguém, Noço Guia parece não saber do óbvio, e foi pedir aos bancos para “destravarem” o crédito para evitar que a crise financeira mundial atacasse o país com mais força (opa, peraí… não era uma marola?). Quer saber mais? Leia essa nota da Folha.
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