Esse é do bom!
Precisamos descobrir com urgência o que o Leonardo Boff anda fumando. Leia o texto abaixo, publicado originalmente no Blog do Noblat, e avalie você mesmo o teor de THC do material consumido pelo teólogo.
O novo patamar da mundialização: a noosfera
A atual crise econômica está colocando a humanidade diante de uma terrível bifurcação: ou segue o G-20 que teima em revitalizar um moribundo – o modelo vigente do capitalismo globalizado – que provocou a atual crise mundial e que, a continuar, poderá levar a uma tragédia ecológica e humanitária ou então tenta um novo paradigma que coloca a Terra, a vida e a Humanidade no centro e a economia a seu serviço e então fará nascer um novo patamar de civilização que garantirá mais equidade e humanidade em todas as relações a começar pelas produtivas.
Crise econômica e seleção natural
Nova Granada, no interior de São Paulo, é uma cidade interessante. Conheço cerca de uma dúzia de granadenses, nenhum deles pessoas “normais”. Fábio Gandour é um desses “pontos fora da curva”: para se ter uma idéia do quão incomum é o sujeito, o Fábio é, ao mesmo tempo, médico (pediatra, se não me engano) e cientista-chefe da IBM(!!!). Conheci o Fábio no lançamento do meu livro “Prática na teoria”, e infelizmente nunca mais falei com ele.
Ao ler a última edição da revista Galileu, deparei com um artigo do Fábio, sobre crise econômica e seleção natural. Googlei “fabio gandour” de todo jeito, e não consegui encontrar nem o e-mail do Fábio, nem uma versão eletrônica do artigo (no site da revista, não está disponível). Por isso, escaneei o texto (vide abaixo) para poder comentá-lo, e fica aqui o convite para o Fábio responder aos meus comentários, se ele chegar a trombar com esse post. (Se algum conhecido do Fábio estiver lendo, peço a gentileza de encaminhar o link do post para ele).
A solução para a crise econômica? Seleção natural
No ano em que comemoramos os 200 anos do nascimento de Charles Daarwin e 150 da publicação do livro A Origem das Espécies, talvez também seja a hora de discutirmos uma questão bastante incômoda a ponto de ser constantemente evitada. Se em sua obra-prima Darwin construiu a teoria da evolução dos seres vivos, por que não analisar os obstáculos causados pelo progresso da ciência ao pleno exercício da seleção natural?
Antes de embarcarmos nessa direção, é recomendável que o leitor se desfaça, temporariamente, de qualquer influência de princípios éticos, morais e, principalmente, religiosos, para poder se concentrar apenas em aspectos técnicos e científicos. Sob o ponto de vista essencialmente científico, o homem, quando se empenha em tratar doenças e evitar a morte, impede a ação da seleção natural. Sim, visto pelo ângulo técnico da dinâmica populacional, o progresso da medicina atrapalha a seleção natural.
Ao impedir ou mesmo adiar a morte de indivíduos que apresentam alguma inaptidão para sobreviver e que morreriam naturalmente, evitamos ou prorrogamos a ação da seleção natural. O prolongamento da vida de um ser vivo frágil também aumenta suas chances de se reproduzir e transmitir essa fragilidade a seus descendentes.
A seleção natural sepultaria essa fragilidade e, por isso, tem o notório efeito de melhorar a competitividade, eliminando falhas e abrindo espaço para a sobrevivência dos indivíduos mais resistentes e bem adaptados.
Ao tolher a sua ação, evitamos que aquela população evolua para um novo patamar, mais competitivo. Essa verdade, um tanto inconveniente, vale tanto para a medicina quanto para qualquer outra ciência destinada a prolongar a vida de um ser vivo que se encontre enfermo por uma determinada razão. Trata-se de uma verdade cruel, mas incontestável.
E já que viemos até aqui, podemos ir mais longe na mesma direção. No caso do homem, a atitude de proteger a vida e impedir a seleção natural dos inaptos ao ecossistema do momento já se transformou em um valor social incorporado ao comportamento das populações. Um valor às vezes questionável, mas que, mesmo assim, se manifesta com frequência.
Um exemplo disso pode ser visto na atual crise econômica. O cenário globalizado em que ela acontece pode, com alguma poesia, ser chamado de ecossistema financeiro mundial. De repente, alguns “indivíduos” dessa população começaram a apresentar sintomas de grave enfermidade, que logo se alastrou por quase todo o ecossistema. Se deixássemos a seleção natural atuar, esses bancos adoecidos por dívidas impagáveis, créditos de origem duvidosa, pagamentos de bônus de mérito discutível e outras fragilidades estruturais, deveriam ser naturalmente selecionados para morrer.
Assim, levariam para o túmulo seus atributos genéticos representados por uma administração ineficiente e que bordeja a ilegalidade. Seria a seleção natural atuando com liberdade, eliminando uma espécie frágil e deficiente para abrir espaço no ecossistema para o surgimento de outra espécie mais bem adaptada e, portanto, mais forte.
Mas não é isso que vem acontecendo – e que seria extremamente saudável nesses casos. Como já incorporamos um valor social que combate a seleção natural, internamos os bancos enfermos em UTls de hospitais com nomes incomuns, como Federal Reserve Bank, sistematicamente mantidos por governos. Nessas UTIs, bilhões de dólares são injetados nas veias dos “pacientes”, e eles não morrerão. Ao sobreviver, terão novas chances para reproduzir e transmitir a seus descendentes todas as falhas atuais de seus organismos. Mais uma vez, a seleção natural não ocorreu. Na verdade, o ecossistema involuiu.
Charles Darwin nunca foi banqueiro – nem bancário -, mas até no ecossistema financeiro globalizado sua teoria da evolução teria sido útil se acontecesse com liberdade e naturalidade.
Comento:
Tudo o que comentar a seguir não terá, como recomenda o autor, qualquer viés moral (aliás, é a mesma recomendação que faço no meu livro). O problema é que, focando no aspecto exclusivamente material, deixar a seleção natural agir livremente não leva, necessariamente, aos melhores resultados. “Evolução”, no sentido darwinista, nada tem a ver com “melhoria” ou “progresso”, mas sim com “sobrevivência diferencial de populações”. Vejamos, como exemplo, o que está ocorrendo em relação à resistência à malária – uma das poucas frentes de evolução humana atualmente em curso.
Em determinadas regiões do planeta, existem populações portadoras de uma mutação que produz hemácias ligeiramente deformadas, o que gera uma doença hereditária chamada anemia falciforme. Essa doença gera diversos problemas mais ou menos similares à anemia comum: hemorragias, descolamento de retina, acidente vascular cerebral, enfarte, calcificações em ossos, e insuficiência renal e pulmonar. Mas, por outro lado, imuniza a pessoa contra a malária (ou atenua as crises). Em regiões muito afetadas pela malária, a seleção natural favorece a sobrevivência de populações portadoras da mutação porque a malária mata mais que as conseqüências da anemia falciforme. Essas populações, mais evoluídas no sentido darwinista, serão, de fato, melhores que as populações sem anemia falciforme? De jeito nenhum, tanto é que em regiões em que a malária está sob controle, a anemia falciforme acaba selecionada para desaparecer.
Por isso, é sempre muito temerário fazer qualquer afirmação como a da primeira parte do artigo, de que a seleção natural “tem o notório efeito de melhorar a competitividade, eliminando falhas e abrindo espaço para a sobrevivência dos indivíduos mais resistentes e bem adaptados”. Mas este não é o problema mais grave do artigo. Quando o autor sugere que se deixe as empresas afetadas pelos erros que levaram à crise econômica mundial à sorte da “seleção natural”, está cometendo um erro já testado em várias crises anteriores, em especial a crise de 1929. Trata-se da aplicação do liberalismo clássico, que Keynes mostrou não resolver em situações de grave crise.
Internar empresas como o Citibank e a GM em UTIs financeiras, por outro lado, não significa “involução” – pelo contrário: o Citi e a GM do futuro deverão ser empresas muito melhoradas. Empresas não são organismos, embora se pareçam com eles em alguns aspectos. O Citibank de 2012 não deverá carregar os “genes ruins” que o levaram à insolvência em 2008/09 justamente porque passou por uma situação que quase o matou. Empresas, ao contrário de organismos, podem alterar seus genes.
Risco EUA?
De acordo com o artigo abaixo, do David Walker (ex controlador-geral das finanças públicas dos EUA) publicado no Financial Times, os títulos do governo estunidense estão em cheque – durante um período, os títulos do McDonald’s teriam sido avaliados como de menor risco que os do Tesouro dos EUA (!!!). Como será o mundo financeiro se os T-Bonds deixarem de ser AAA? Aí sim veremos uma crise complicada.
Classificação dos EUA sob risco
Os gastos com saúde e os desequilíbrios fiscais ameaçam a classificação AAA dada por agências aos EUA
MUITO ANTES da crise, quase dois anos atrás, uma nuvem negra não muito perceptível surgiu no horizonte do governo dos EUA. Foi ignorada. Mas agora aquela sombra, na forma de alerta vindo de uma das grandes agências de classificação de crédito no sentido de que o país corre risco de perder sua classificação AAA caso não comece a colocar as finanças em ordem, voltou para nos assombrar.
O alerta da Moody’s tinha por foco a disparada dos custos da Previdência e da saúde, que ameaçam afundar o governo em dívidas pelas próximas décadas. Os fatos mostram que estamos em forma ainda pior agora, e há sinais de que a confiança na capacidade dos EUA de controlar suas finanças está se abalando.
Os preços dos seguros contra inadimplência para títulos do Tesouro norte-americano subiram, o que significa que os investidores agora arcam com custo maior para proteger seus investimentos em papéis do Tesouro. Aliás, por um breve período, tornou-se mais caro comprar proteção para investimentos em títulos do Tesouro do que em papéis da McDonald’s. Outro sinal de alerta surgiu na China, onde o primeiro-ministro e o presidente do BC expressaram preocupação quanto à situação de crédito em longo prazo dos EUA e o valor do dólar.
A despeito da desaceleração econômica, os EUA dispõem dos recursos, do conhecimento e da resistência necessários a restaurar sua economia e cumprir seus compromissos. Além disso, muitos dos trilhões de dólares recentemente canalizados para o sistema financeiro com sorte resultarão em uma recuperação, o que estimulará a economia.
O governo dos EUA conta com a classificação AAA de crédito para seus títulos desde 1917, mas não se sabe por quanto tempo essa situação vai persistir. Na minha opinião, basta que aconteça uma ou duas coisas para que venhamos a perder nossa classificação de crédito impecável.
Primeiro, embora uma reforma abrangente da saúde seja necessária, ela não deve debilitar ainda mais as condições financeiras do país. Fazê-lo sinalizaria que a prudência fiscal está sendo ignorada, como resultado do esforço de atender às necessidades sociais, o que colocaria o futuro do país sob ameaça ainda maior.
Segundo, se o governo não conseguir desenvolver um processo que permita que escolhas duras quanto a gastos, impostos e controle de Orçamentos sejam tomadas quando superarmos a crise econômica, isso sinalizaria que o nossos sistema político não está à altura da tarefa de enfrentar os grandes desequilíbrios que teremos de encarar, tanto conhecidos quanto desconhecidos.
Como se poderia justificar uma nota AAA para uma entidade com passivo líquido acumulado de mais de US$ 11 trilhões e obrigações adicionais não contabilizadas de US$ 45 trilhões? Uma entidade que deve registrar déficits anuais de ao menos US$ 1 trilhão por ainda muitos anos?
A nação precisa promover uma reforma abrangente na saúde. Mas é importante que não voltemos a nos sabotar. Uma reforma deveria reduzir as imensas promessas de saúde que já temos, bem como os imensos e crescentes déficits estruturais que ameaçam o nosso futuro.
Uma forma de escapar a esses problemas é que o presidente e o Congresso criem uma “comissão do futuro fiscal”, em que tudo isso esteja em debate, incluindo controles de Orçamento, reformas em programas de benefícios e alta de impostos.
Temos de agir antes que venhamos a enfrentar crise econômica muito maior. Não devemos esperar pelo rebaixamento de nossa classificação de crédito. Para Washington, o momento de despertar é agora.
Pela volta dos chatos aos bancos
(Este post é dedicado aos meus ex-chefes no Citibank)
No artigo abaixo do Paul Krugman, publicado hoje no The New York Times, faz-se uma correlação inversa entre “chatice bancária” e crise financeira: quanto mais chato está o setor bancário, menos provável ocorrer uma nova crise. De fato, percebi isso na formação da atual crise: o ambiente de negócios dos últimos anos estava significativamente mais jovem, agitado, criativo e vibrante que na época que eu ingressei no mercado, em fins dos anos 1980. No início do ano passado, por exemplo, tive uma série de reuniões na sede de um dos maiores bancos americanos no Brasil (envolvido até os ossos na crise, por sinal), e não vi ninguém mais velho que eu trabalhando lá (tinha 40 anos na época). Meu interlocutor, reponsável por negócios bilionários, tinha 25 anos, e o ambiente mais parecia uma alegre agência de propaganda, com bichinhos fofos enfeitando monitores e ninguém usando gravata.
Tornar os bancos chatos
Há mais de 30 anos, quando eu era aluno de pós-graduação em economia, somente os meus colegas menos ambiciosos buscavam carreiras no mundo financeiro. Mesmo na época, os bancos de investimento pagavam mais do que o ensino ou o serviço público -mas não tanto assim e, de qualquer forma, todo mundo sabia que trabalhar em banco era, bem, chato.
Nos anos que se seguiram, os bancos se tornaram tudo, menos chatos. As negociações e estratégias prosperaram, e os salários saltaram, atraindo muitos dos melhores e mais brilhantes de nossos jovens (está bem, não tenho certeza quanto aos “melhores”). Assim, estávamos certos de que nosso setor financeiro de tamanho exagerado era a chave para a prosperidade.
Em vez disso, contudo, as finanças viraram o monstro que comeu a economia mundial.
Recentemente, os economistas Thomas Philippon e Ariell Reshev distribuíram um artigo que poderia ter o título de “Ascensão e queda dos bancos chatos” (de fato, o título é “Salários e capital humano na indústria financeira dos EUA, 1909-2006”). Eles mostram que os bancos nos EUA passaram por três eras no último século.
Antes de 1930, a indústria bancária era excitante, com uma série de figuras de peso, que construíram impérios financeiros gigantescos (mais tarde soube-se que alguns destes eram baseados em fraudes). Esse setor de finanças próspero liderou um rápido aumento no endividamento: a dívida domiciliar quase dobrou em relação ao PIB entre a Primeira Guerra Mundial e 1929.
Durante essa primeira era nas finanças, os banqueiros ganhavam em média muito mais do que seus colegas das outras indústrias. Contudo, o setor financeiro perdeu seu glamour quando o sistema bancário desmoronou durante a Grande Depressão.
A indústria bancária que emergiu daquele colapso era fortemente regulada, muito menos colorida do que tinha sido antes da Depressão e muito menos lucrativa para os que a dirigiam. O setor ficou sem graça, em parte porque os banqueiros eram tão conservadores em seus empréstimos: a dívida domiciliar, que tinha caído fortemente em relação ao PIB durante a Depressão e a Segunda Guerra Mundial, ficou bem abaixo dos níveis anteriores a 1930.
É estranho dizer, mas essa era de bancos chatos também foi uma era de progresso econômico espetacular para a maior parte dos norte-americanos.
Depois de 1980, contudo, com a mudança nos ventos políticos, muitas das regulamentações dos bancos foram suspensas -e o setor tornou-se empolgante novamente. A dívida começou a subir rapidamente, eventualmente chegando a quase o mesmo nível em relação ao PIB que em 1929. E a indústria financeira explodiu de tamanho. Em meados desta década, respondia por um terço dos lucros corporativos.
Com essas mudanças, as finanças novamente se tornaram uma carreira que recompensava bem -espetacularmente bem, para os que construíram novos impérios financeiros. De fato, o aumento dos salários nas finanças teve um grande papel em criar a segunda Era Dourada dos EUA.
Nem é preciso dizer que os novos super-astros acreditavam que mereciam sua riqueza. “Acho que os resultados de nossa empresa, de onde veio a maior parte de minha riqueza, justificaram o que eu recebi’, disse Sanford Weill, em 2007, um ano após se aposentar do Citigroup. Muitos economistas concordaram.
Somente poucas pessoas advertiram que este sistema financeiro sobrecarregado poderia ter um final ruim. Talvez a Cassandra mais notável tenha sido Raghuram Rajan, da Universidade de Chicago, ex-economista do Fundo Monetário Internacional que argumentou em uma conferência em 2005 que o rápido crescimento das finanças tinha aumentado o risco de um “derretimento catastrófico”.
Entretanto, outros participantes da conferência, inclusive Lawrence Summers, hoje diretor do Conselho Econômico Nacional, ridicularizaram as preocupações de Rajan.
E o derretimento chegou.
Grande parte do aparente sucesso da indústria financeira agora é visto como ilusão. (As ações do Citigroup perderam mais de 90% de seu valor desde que Weill se congratulou.) Pior ainda, o colapso do castelo de cartas financeiro criou caos no resto da economia, com o comércio mundial e a produção industrial de fato caindo mais rápido do que fizeram na Grande Depressão. E a catástrofe levou a pedidos de mais regulamentação da indústria financeira.
Entretanto, minha sensação é que as autoridades ainda estão pensando mais em reorganizar os caixas no organograma da supervisão bancária. Não estão de forma alguma prontos para fazer o que precisa ser feito -que é tornar o setor bancário chato novamente.
Parte do problema é que uma atividade bancária sem graça significaria banqueiros mais pobres, e a indústria financeira ainda tem muitos amigos em altas posições. Entretanto, é também uma questão de ideologia: apesar de tudo que aconteceu, a maior parte das pessoas em posição de poder ainda associa finanças sofisticadas com progresso econômico.
Será que podem ser convencidas do contrário? Teremos a disposição de fazer uma reforma financeira séria? Se não, a atual crise não será um evento único; formatará o que está por vir.
S.I.S.T.E.M.A.
Para os saudosistas do Agente 86 (lembram da K.A.O.S. e o do C.O.N.T.R.O.L.E.?), um artigo sobre o S.I.S.T.E.M.A. do Leonardo Boff, diretamente da década de 1960 (via blog do Noblat):
Nova cartada do sistema?
O encontro dos G-20 em Londres levou a uma tensa convergência entre as propostas norteamericana e a européia. Esta prevê controles e regulações mais rígidas dos mercados e a nortemaericana procura salvar o sistema bancário privado com a injeção estatal de bilhões e bilhões de dólares, tirados dos contribuintes, com o propósito de alavancar os créditos e garantir a continuação do consumo. Há indicações de que Barack Obama se comprometeu a assimilar algo da proposta européia e desta forma criar um consenso mínimo para enfrentar coletivamente a crise.
Cumpre, entretanto, reconhecer que ambas as soluções são intrasistêmicas e nada inspiradoras. pois de modo algum colocam em xeque o modo de produção capitalista e sua expressão política, o neoliberalismo. Curiosamente, Sarkosy, num artigo do dia 1 de abril, propunha um capitalismo cooperativo e solidário como forma de sair do caos. Parece entender pouco da lógica do capital, pois este se rege pela competitividade e não pela cooperação. A solidariedade na é categoria do capital, senão não teríamos tantos milhões de excluídos. Se alguém achar que o capitalismo é bom para os trabalhadores é um iludido. O capital é bom para os capitalistas que detém o ter, o saber e o poder.
Os encamnhamentos dos G-20 mantém a acumulação do capital como o principal motor do funcionamento da economia e o mercado livre como o lugar de sua reprodução. Isso simplesmente é mais do mesmo. Não ataca as causas que levaram à crise. A crise econômico-financeira é vista fora do contexto global de crise: social, alimentaria, energética, climática e ecológica. Todas estas crises são consideradas como externalidades, quer dizer, fatores que não entram na contabilidade do capital, como o deslocamento de milhões de pessoas do campo para as cidades, o desflorestamento, a contaminação do solo, do mar e do ar. Estes fatores só são tomados em consideração quando se revelam empecilho para os ganhos do capital.
Mas não há como evitar a questão ética: trata-se de uma solução que contempla a humanidade como um todo e que garante a vitalidade ao planeta Terra? Ou simplesmente se trata de salvar o sistema do capital para beneficiar os que acumulam? Será mais uma cartada do sistema? Trata-se de uma crise no sistema ou uma crise do sistema?
Tudo indica que se trata de uma crise do sistema. As duas externalidades maiores – a social e a ambiental – não ganham centralidade. Mas elas são de tal gravidade que põem em xeque as soluções propostas, possuindo somente sustentabilidade a curto e a médio prazo. Depois voltará a crise, possivelmente, sob a forma de tragédia ou de farsa (Marx).
A crise social mundial é terrificante. Os dados do PNUD 2007-2008 atestam que os 20% mais ricos absorvem 82,4% das riquezas mundiais enquanto os 20% mais pobres têm que se contentar com apenas 1,6%. Quer dizer, é uma pequeníssima minoria que, em escala mundial, monopoliza o consumo enquanto os zeros econômicos são lançados na miséria. Há mais de 900 milhões de famintos e a cada quatro segundos morre um ser humano de fome conforme refere J. Ziegler em seu relatório para a ONU sobre a pobreza no mundo. Que cabeça e que coração têm analistas notáveis do Brasil (vide M. Leitão e Sardenberg) que sabem disso tudo e mesmo assim defendem um sistema de tanta perversidade?
A crise ecológica não é menor. Estamos já dentro do aquecimento global que vai ser devastador para milhões de pessoas e para a biodiversidade. E. Wilson, renomado biólogo, denunciou que a cada ano a voracidade capitalista elimina definitivamente 3.500 espécies de seres vivos. Diante deste quadro dramático, só nos resta repetir o que deixou escrito em latim o gênio da critica ao capital: “dixi et salvavi animam meam”: “disse e salvei a minha alma”.
Até o Dossiê-Bufunfa está otimista?
O blog The Wealth Report – que, numa tradução livre, poderia ser chamado de dossiê-bufunfa – tem por especialidade tripudiar sobre os loiros de olhos azuis ultra-endinheirados na atual crise econômica, mostrando como o bicho está pegando para o lado dos ricos. Nos últimos seis meses, seu autor, Robert Frank (que escreveu um livro excelente sobre o comportamento dos bilionários, o “Riquistão”), tem sido especialmente sarcástico com as notícias do dia-a-dia da crise. Por isso, as notícias desse blog nunca são otimistas, pelo contrário: a mensagem sempre é algo na linha do “não vai ficar assim não, vai piorar muito ainda”. Pelo menos assim era há até pouquíssimo tempo. Ontem, o Frank publicou um post otimista sobre o tema, que merece destaque pela sua raridade. O destaque é para o aumento dos indicadores de confiança dos investidores endinheirados, que esperam recuperação em seis meses. É lógico que os ricos nem sempre estão certo – tanto é que foram eles quem mais perderam na crise atual -, mas somente o fato deles estarem mais propensos a consumir e investir mais já é um bom sinal, já que isso pode deflagrar um círculo virtuoso na economia.
Música de banqueiro
A música “Argumento” do Paulinho da Viola tem duas estrofes básicas. Os banqueiros, na atual crise econômica, só cantam a segunda, que diz “Faça como um velho marinheiro / Que durante o nevoeiro / Leva o barco devagar”. Mas já está mais do que na hora de voltar a cantar a primeira estrofe:
Tá legal
Tá legal, eu aceito o argumento
Mas não me altere o samba tanto assim
Olha que a rapaziada está sentindo a falta
De um cavaco, de um pandeiro ou de um tamborim
RL=C+ΔP
Nesse post sobre a pós-crise, começamos a falar sobre o problema do consumismo epidêmico (que chamo de boletite), sua relação com a gênese da crise atual, e como fazer para evitar que crises como a que o mundo passa atualmente ocorram novamente. Neste, veremos que tudo se reduz a uma equação bem simplezinha, mais ou menos como a famosa E=m.c² do Einstein, que explicava a relatividade com somente 3 variáveis:
RL=C+ΔP, onde:
*RL: renda líquida auferida em um determinado período;
*C: consumo neste mesmo período; e
*ΔP: aumento ou diminuição da poupança líquida no período (P1-P0)
Ou seja:
Tudo o que uma pessoa obtém de rendimentos em um determinado ano é equivalente ao que essa pessoa consumiu neste mesmo ano mais a variação verificada em seus investimentos (diferença entre os saldos em 01/01 e 31/12 daquele ano). Se eu ganhei $100mil em 2008 e aumentei minha poupança em R$20mil, concluo que meu consumo foi de R$80mil. Simples assim.
Quando o Malloch Brown (vide artigo do Clóvis Rossi no post sobre a pós-crise) fala sobre “uma nova visão de futuro de um mundo menos conduzido pelo consumismo”, isso significa que teremos de encontrar maneiras de diminuir a boletite, a tendência das pessoas a consumir exageradamente. Já se tentou isso antes várias vezes, e nunca se conseguiu muito sucesso, como no malfadado exemplo do comunismo soviético, e no cristianismo. No fim, as pessoas sempre encontram formas de burlar as regras para ostentar um padrão de consumo superior ao dos seus pares, isso é um comportamento esperado para indivíduos da espécie H.sapiens.
Entretanto, se mudarmos a tributação, da renda para o consumo, haverá um forte estímulo para que as pessoas destinem parcelas cada vez maiores de sua renda para a poupança, evitando uma epidemia consumista. Basta manipular a fórmula: se RL=C+ΔP, então C=RL–ΔP; assim, se a tributação incidir sobre a diferença entre entre a renda e o aumento da poupança, quanto mais se poupar menos imposto se pagará. Esta seria, então, a fórmula mágica do mundo pós-crise.
(Essa não é uma proposta minha, e também não se trata de nenhuma novidade. Ela aparece no capítulo final de “Luxury Fever – Money and happiness in an era of excess” – foto acima, um livro de 1999 do Robert H. Frank).
O pós-crise
Há um ano, publiquei um artigo no portal administradores.com sobre a boletite, que é o consumismo epidêmico por que passávamos na época, logo antes da crise econômica atual chegar para ficar. Na verdade, o primeiro estágio da crise, o problema dos subprimes, já estava acontecendo, e eu dizia naquele artigo que a sua causa era justamente a boletite que impelia as pessoas a consumir casas cada vez maiores e mais caras.
Alguns meses depois, dei uma palestra sobre o assunto, e propus uma estratégia de combate à boletite baseada numa mudança radical na política tributária das pessoas físicas, hoje focada na renda das pessoas. A idéia é desonerar a parte da renda direcionada à poupança e sobre-onerar a parcela destinada ao consumo, o que faria com que a sociedade ficasse mais saudável em termos econômicos e evitaria a ocorrência de uma corrida consumista insana, a causa original da atual crise econômica. Logo depois, a crise econômica se agravou, o Lula saiu falando para todo mundo comprar TV de plasma a prestação, e ficou impossível continuar com esse debate.
Agora, às vésperas da reunião do G-20, o combate à boletite está voltando ao centro da cena. Veja a coluna do Clóvis Rossi de hoje (logo abaixo). Volto a esse assunto depois.
Além da bruma da crise
Por fim, na vertigem da crise, algumas vozes do establishment começam a olhar além e a tentar adivinhar -ou desejar- como seria o mundo pós-crise.
Uma das vozes atende pelo nome de Luiz Inácio Lula da Silva e diz, em artigo ontem publicado pelo “Le Monde”, que, “mais grave que uma crise econômica, estamos diante de uma crise de civilização. Ela exige novos paradigmas, novos modelos de consumo e novas formas de organização da produção”.
Concorda com ele relatório da Comissão de Desenvolvimento Sustentável, instituto independente de assessoria do governo britânico, que procura separar “prosperidade” de “crescimento”. O texto pede aos governos para “desenvolver um sistema econômico sustentável que não se apoie em um consumo sempre crescente”.
Reforça Malloch Brown, o principal negociador britânico para a cúpula do G20: “Veremos [após a crise] uma recalibrada no estilo de vida, toda uma nova visão de futuro de um mundo menos conduzido pelo consumismo, talvez com o acréscimo de um mundo no qual o poder tenha sido algo mais bem distribuído”.
Fecha o circuito Pascal Lamy, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio e um funcionário internacional ao qual se é obrigado a prestar atenção pela qualidade de suas análises: “O modelo de capitalismo que conhecemos nos últimos 50 anos não se sustenta. A questão fundamental é saber se há que readaptar, arrumar ou reformar o capitalismo ou se é preciso ir além, ser mais profundo nas mudanças e ir mais fundo nos retoques”. Completa: “Creio que não temos que nos satisfazer intelectualmente com o horizonte atual do capitalismo”.
Bem-vindos todos ao clube do “outro mundo é possível”. Mas palavras só não bastam. Vocês que são todos “insiders”, que tal reconstruir a civilização?
Bônus são de direita ou de esquerda?
Está a maior gritaria nos EUA por causa do pagamento de bônus a executivos de empresas na UTI do Obama, como a seguradora AIG. A histeria já se alastrou para o Brasil, com sindicalista querendo re-estatizar a Embraer por causa dos mesmos bônus (que não tem nada a ver com o caso da AIG, vide esse post aqui). Pelo que se lê na imprensa, os bônus são uma invenção malévola de capitalistas de ultra-direita para sacanear os pobres proletários expropriados de dignidade… Mas é exatamente o contrário!!! Vejamos como ocorre a contextualização política dos bônus, ora de esquerda, ora de direita:
De acordo com a teoria marxista (que explica a relação capital-trabalho de maneira brilhante), o dono dos meios de produção, o capitalista, paga pelo trabalho adquirido do proletário um valor menor do que ele realmente vale (assim como compra matérias primas por um preço inferior ao que vende), para com isso obter seu precioso lucro. No caso do trabalho, a diferença de preços – ou seja: o quanto o capitalista recebe de seu cliente pelo trabalho revendido menos o que ele paga ao trabalhador – é chamada de mais-valia. Essa mais-valia, portanto, é um recurso que o trabalhador teria direito a receber, mas que o capitalista é quem o recebe porque ele é o dono dos meios de produção (e do negócio em si, afinal de contas). É por isso que o discurso de Marx sobre “a injustiça social intrínseca do capitalismo” cola com tanta facilidade: ela de fato existe, não é difícil perceber.
Na época do barbudo, os trabalhadores somente recebiam salários fixos (por hora, dia, semana ou mês trabalhado). Mas, há mais ou menos um século, algumas classes começaram a conseguir negociar uma certa remuneração variável – que, como o nome diz, varia de acordo com determinados eventos. Por exemplo, se uma costureira produzia um vestido por dia e passasse a produzir dois, seu salário poderia dobrar. Essa história de remuneração variável, embora signifique um aumento da renda do trabalhador, nunca foi muito bem digerida pelos marxistas, que sempre a olharam como uma espécie de “suborno” que os proletários receberiam dos seus patrões. Mas o fato é que a remuneração variável é interessante para o proletariado, e por isso acabou se perpetuando, a despeito de todas as tentativas dos sindicalistas para melar tais acordos, e hoje é vista com bons olhos pela esquerda liberal.
Ora, se um operário pode receber uma remuneração variável atrelado à produtividade, por que não seu chefe? É aí que a coisa começa a ficar meio estranha, pois os cargos administrativos não “produzem” nada por definição (“produção” aqui entendida no seu sentido mais básico, de por a mão na massa mesmo), logo não haveria produtividade a ser premiada. Quando a remuneração variável atinge os níveis de diretoria e presidência, os parâmetros que a regulam acabam muito próximos dos que interessam aos capitalistas, ou seja: os altos executivos de uma empresa são premiados de maneira análoga aos acionistas. No fim das contas, pelo lucro. É aí que surgem as “stock options“, esquemas de remuneração variável com pagamento em ações da empresa em que o sujeito que recebe a remuneração variável trabalha. Nascem, enfim, os bônus como os que conhecemos hoje.
Quando os operários recebem acréscimos pacuniários por melhoria em produtividade, é muito claro que capital e trabalho estão cooperando: quanto mais o patrão lucrar, maior o salário do empregado e vice-versa – e é justamente essa harmonia capital-trabalho que irrita os sindicalistas mais fiéis ao marxismo, menos comuns hoje em dia. Mas, estranhamente, no caso dos executivos, a história é outra. Quando o presidente executivo da fábrica assina seu contrato de trabalho com o conselho de acionistas, inicia-se um relacionamento intrinsecamente conflituoso, não mais cooperativo como ocorre no caso dos operários. O executivo e o acionista encontram-se em campos opostos: o primeiro quer embolsar o máximo possível em bônus o mais rápido que der, enquanto o acionista quer pagar o mínimo (de preferência, nada) no prazo mais dilatado. Num momento de crise como o atual, percebe-se esse conflito muito claramente.
O interessante é que os executivos que recebem bônus extraordinários estão combatendo o capital, mas nem por isso são admirados pela esquerda, já que eles mesmos acabam se tornando capitalistas, dado o imenso volume de suas remunerações variáveis. O mais maluco ocorre quando esses bônus contratados com os capitalistas acabam tendo que ser honrados pelo Estado, como acorreu com a AIG. Aí, o combate muda de figura, e quem paga os bônus não são mais os capitalistas, mas a população em geral. Embora quem financie o Estado sejam os ricos e as grandes corporações, todo mundo paga impostos de uma forma ou de outra, e o prejuízo é socializado. No fim das contas, a sociedade toda se sente lesada pelos executivos, e aí o jogo não tem mais a graça que tinha quando eram os capitalistas que ficavam com o prejuízo. Neste momento, os bônus voltam a ser de direita. Louco isso, não?
A prova do crime
Que o mercado financeiro dos EUA quebrou, todo mundo sabe; e que houve um descaso absurdo com a fiscalização, também. Mas nada como ver as provas concretas do crime. No blog do Crédito, o leitor Camilo Telles colocou o link para a denúncia feita contra o fundo do Madoff à SEC (a CVM deles) em 2005. É impressionante. A denúncia se chama “O maior fundo do mundo é uma fraude”, de Harry Markopolos, um analista financeiro de Wall Street altamente qualificado, que aplicou a Mosaic Theory para levantar 29 red flags que apontavam para o fato de que o fundo do Madoff era uma pirâmide (esquema Ponzi).
O que a SEC fez com o relatório do Markopolos? Engavetou. Até que o fundo explodiu no final de 2008, deixando um rombo de mais de US$50bilhões para trás.
Ô dó!!!
Será que a ONU não mandar alguma ajuda humanitária para esses pobres coitados? Olha só o que está acontecendo no Riquistão*, de acordo com reportagem da Folha Online (quem me chamou a atenção para a triste tragédia foi o meu amigo Antonio Maia):
Bilionários perdem US$ 2 tri em um ano
Gates tem queda de US$ 18 bi na fortuna, mas volta a ser o mais rico do mundo; no Brasil, liderança é de Eike, com US$ 7,5 biO indiano Anil Ambani foi o que mais perdeu na lista da “Forbes”, US$ 31,9 bilhões; 55 russos deixaram de ter o status de bilionário
Se 1 bilhão a mais ou a menos faz diferença na vida de uma pessoa, talvez esse seja o momento ideal para fazer essa pergunta. Os homens mais ricos do mundo perderam 45% da sua fortuna em um ano, ou US$ 2 trilhões (o equivalente ao PIB italiano, a sétima maior economia global), segundo o ranking da revista “Forbes”.
A crise atual, que derrubou Bolsas pelo mundo, levou grandes economias para a recessão e derrubou milhões de pessoas para abaixo da linha de pobreza, também varreu a fortuna dos bilionários. No ano passado, eram 1.125 pessoas com uma fortuna de ao menos US$ 1 bilhão, que juntos tinham US$ 4,4 trilhões (o PIB japonês). Agora são 793 bilionários, com patrimônio total de US$ 2,4 trilhões. Na média, cada um tem US$ 3 bilhões -US$ 900 milhões menos que em 2008.
O impacto já pode ser medido no topo do ranking, que voltou a ter a liderança de Bill Gates, mesmo tendo perdido US$ 18 bilhões. A fortuna atual de Gates, US$ 40 bilhões, o colocaria no sétimo lugar em 2008. O líder do ano passado, Warren Buffett, perdeu ainda mais, US$ 25 bilhões, e agora é o segundo. Já o mexicano Carlos Slim, terceiro colocado, teve a mesmo prejuízo de Buffett e conta com US$ 35 bilhões.
Juntas, as dez pessoas mais ricas do mundo têm US$ 253,9 bilhões (aproximadamente todos os bens e serviços produzidos pela Argentina), ante US$ 426 bilhões no ano passado. Ou seja, em um ano eles perderam pouco mais de 10% do PIB brasileiro. Uma das consequências é que o décimo homem mais rico, o espanhol Amancio Ortega (da rede de lojas Zara), com um patrimônio de US$ 18,3 bilhões, não ficaria nem entre os 25 primeiros no ano passado.
No Brasil, o único que viu sua fortuna crescer foi Eike Batista, para US$ 7,5 bilhões, e é agora o homem mais rico do país e o 61º do mundo. O antigo líder, Antônio Ermírio de Moraes, perdeu quase o patrimônio de Eike, US$ 7,2 bilhões, e é o sexto mais rico do país. Ao todo são 14 bilionários brasileiros -quatro a menos que em 2007-, com uma fortuna total de 40,3 bilhões, ante US$ 65,1 bilhões de 2008. Elie Horn (Cyrela), Liu Ming Chung (da chinesa Nine Dragons), Jayme Garfinkel (Porto Seguro) e Rubens Ometto (Cosan) deixaram a lista.
Mas outros emergentes perderam ainda mais que o Brasil. A Rússia, por exemplo, viu 55 deixarem a lista (agora conta com 32), e aquele que era o mais rico do país e o nono do mundo, Oleg Deripaska, da Rusal, perdeu US$ 24,5 bilhões e, com US$ 3,5 bilhões, é agora o décimo bilionário russo. Na Índia, 29 não têm mais o status de bilionário e ninguém na lista da “Forbes” teve perda maior que Anil Ambani (que atua em áreas como telecomunicações e finanças): US$ 31,9 bilhões.
*Riquistão é o nome do livro do Robert Frank sobre os bilionários. O autor também publicou um post recentemente muito bom sobre a derrocada dos riquistaneses.
Depressão garantida ou seu derivativo de volta
Hoje, de acordo com o blog da Bárbara Gancia, houve palestra do Nouriel Roubini em São Paulo. E olha que a 6a. feira 13 é só depois de amanhã…
Já temos nosso primeiro Nobel
No final desse ano, teremos uma barbada nas indicações do Prêmio Nobel: nosso estimado presidente Marolinha, que acha que, por ter 84% de aprovação popular, tornou-se automaticamente um gênio. Pelo menos, é o que se espera ao ler essa matéria do Financial Times, publicada no BGrasil pelo UOL/BBC:
Lula diz no ‘FT’ que quer mundo livre de dogmas econômicos
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse esperar um mundo mais “humano” após a eventual recuperação da economia mundial em um artigo exclusivo na página de opinião do jornal “Financial Times” desta terça-feira.
Em artigo exclusivo ao jornal Financial Times, Lula disse esperar um mundo mais “humano” após a eventual recuperação da economia mundial
“Não estou preocupado com o nome que será dado à nova ordem econômica e social que virá depois da crise, desde que seu principal foco seja o ser humano”, diz Lula no jornal.
O texto faz parte de uma série de debates e artigos promovida pelo diário britânico sobre o futuro do capitalismo.
“Hoje ninguém ousa prever qual será o futuro do capitalismo”, afirma Lula. “Como líder de uma grande economia descrita como ‘emergente’, o que posso dizer é que tipo de sociedade espero que apareça depois desta crise… Tenho esperanças de um mundo livre dos dogmas econômicos que invadiram as ideias de muitas pessoas e que foram apresentados como verdades absolutas.”
“Políticas anti-cíclicas não deveriam ser adotadas apenas em épocas de crise. Aplicadas com antecedência – como foi feito no Brasil – elas são a garantia de uma sociedade mais justa e democrática”, escreve o presidente.
Lula ainda descreve outras expectativas que tem para o fim da atual crise econômica global.
“(Espero que surja) uma sociedade que vai valorizar a produção e não a especulação. A função do setor financeiro será de estimular a produtividade – e ele estará sujeito a um controle rigoroso nacional e internacional. O comércio exterior será livre do protecionismo que está mostrando sinais perigosos de estar se intensificando”, diz.
Lula também menciona suas esperanças de uma reforma nas organizações multilaterais e de um novo sistema de governança global.
Em boa parte do artigo, o presidente também relembra sua infância no interior de Pernambuco, o início de sua vida de metalúrgico em São Bernardo do Campo (SP) e sua trajetória política até ser eleito em 2002.
“Para mim o capitalismo nunca foi um conceito abstrato”, escreve.
Capitalismo malvado
Ontem, o João Pereira Coutinho publicou um excelente artigo sobre o capitalismo na Folha de São Paulo que quis dizer mais ou menos a mesma coisa que eu falei no início de dezembro: não há alternativa ao capitalismo, goste-se dele ou não, pode espernear à vontade. Mas a turma do “outro mundo possível” não iria deixar barato, e não foi surpresa encontrar a seguinte carta de leitor na Folha de hoje:
Penso que João Pereira Coutinho errou o lugar de sua coluna. Ela deveria ter sido publicada no lugar de José Simão: “Piada pronta”. Dizer que o capitalismo redistribui, combatendo a miséria, só pode ser uma piada (“O capitalismo é simpático”, Ilustrada). A não ser que “redistribuir” (aspas do próprio Coutinho) seja entre os próprios ricos, e não em relação aos miseráveis deste mundo. Com certeza o continente africano tem sentido muito bem essa redistribuição.
ROBSON MAURO LOUREÇO (Mogi-Guaçu, SP)
Pois é, né Robson… Que coisa a África ser o continente mais miserável do planeta e, por coincidência, também ser justamente onde o capitalismo é menos bem sucedido. O problema, filho de Rob, é que, como bem disse o Coutinho (adaptando Churchill): “o capitalismo é o pior sistema econômico, com a exceção de todos os outros”. Caso você não tenha entendido a sutileza das aspas do “retribui”, entenda que o capitalismo é o melhor sistema para a produção de riqueza e, apesar de sua intrínseca injustiça social, acaba sendo o melhor para os pobres, que pelo menos têm as migalhas que ele gera. Qualquer outro sistema até hoje tentado é ainda pior, pois nem migalhas sobram para a massa.
Num momento de crise como o atual, é tentador decretar a morte do capitalismo, como muitos fizeram. O problema é: o que colocar no lugar?
O capitalismo morreu? Viva o capitalismo!!!
Você que tem ou quer ter um blog, recomendo o WordPress, que é quem hospeda esse humilde instrumento midiático aqui. Recomendo o WP porque as suas funcionalidades estatísticas são incríveis: vc tem como rastrear de onde vem os seus leitores, o que eles estão lendo, para onde eles vão, e tudo com gráficos e tabelas muito fáceis de entender. Foi por causa disso que eu percebi que esse post, de 09/12/2008, uma crítica aos que pregam o fim do capitalismo, começou a ressuscitar 15 dias atrás, e vem crescendo desde então. Não deu para rastrear por que isso aconteceu, quem é que está lendo etc., mas concluí que o assunto está despertando mais interessenas últimas semanas.
Hoje, ao ler a Folha de São Paulo, encontro um artigo do João Pereira Coutinho que, embora muito mais bem escrito que o meu, diz a mesma coisa: o capitalismo não está acabando simplesmente porque não há modelo econômico para o substituir. Como acredito que os leitores do meu post também teriam interesse em conhecer o artigo do Coutinho, segue o texto da Folha abaixo:
O capitalismo é simpático
É precisamente porque existe riqueza criada que é possível “redistribuir”, combatendo a miséria
CURIOSO: EU julgava que Adam Phillips, psicanalista superstar do Reino Unido, era pessoa razoavelmente letrada. Cheguei a ler alguns livros de Phillips, aplaudindo sua erudição e seu humor. Enganei-me. Em artigo para o “Guardian”, na companhia da historiadora Barbara Taylor, Phillips desce o pau no sistema capitalista. O capitalismo, diz ele, não permite uma revalorização do amor desinteressado ao próximo. Que bonito, hein?
Diz Phillips que o homem moderno esqueceu uma virtude fundamental. Existem vários nomes para designar essa virtude: “simpatia”, “generosidade”, “altruísmo”, “benevolência”, “humanidade”, “compaixão”. Mas todos esses nomes pretendem um mesmo fim: permitir que nós, homens egoístas, possamos imaginar as provações e as dificuldades de nossos semelhantes, estendendo a eles uma mão amiga.
No fundo, Phillips condena o mundo hobbesiano do Ocidente capitalista, de todos contra todos. Ele prefere um mundo compassivo e humano, onde todos ajudam todos.
Eu não pretendo ensinar coisa nenhuma a Phillips. Mas posso sugerir um autor que está ausente do texto do psicanalista? Um autor que lançou as sementes da compaixão moderna e, ironicamente, do capitalismo moderno também? Esse autor chama-se Adam Smith (1723 -1790).
Na verdade, o texto de Phillips, em seu amor pela “compaixão”, parece uma longa cópia da “Teoria dos Sentimentos Morais”, obra que Smith publicou em 1759. A ideia que percorre o texto de Smith é simples e poderosa: se existe uma natureza humana comum a todos os seres, ela manifesta-se por meio de “sentimentos” inatos e morais que o homem tem dentro de si. E em que consistem esses sentimentos?
Para Smith, como para Adam Phillips, esses sentimentos manifestam-se na nossa capacidade para, por meio de um exercício de “substituição”, nos imaginarmos no lugar dos que mais sofrem. Esses sentimentos morais são a base de qualquer sociedade civilizada: de uma sociedade em que o destino dos nossos semelhantes não nos pode ser completamente indiferente.
Acontece que Adam Smith não publicou apenas a “Teoria dos Sentimentos Morais”. Em 1776, Smith voltaria a revisitar o argumento com um livro que, consensualmente, é hoje visto como a bíblia do capitalismo. Falo, claro, de “A Riqueza das Nações”, onde Smith pretende demonstrar as virtudes de um sistema de livre comércio. E quais são elas?
A primeira delas, e à imagem do que sucedia na “Teoria dos Sentimentos Morais”, é mostrar como a livre troca também faz parte da natureza dos homens. Uma comunidade que seja capaz de mutilar a liberdade econômica dos seus habitantes não está apenas a empobrecer esses habitantes; está a lhes negar uma forma importante de realização humana e pessoal.
Mas existe uma segunda virtude normalmente esquecida: o capitalismo, longe de enfraquecer os “sentimentos” morais que ligam os homens aos seus semelhantes, é a condição primeira para que esses “sentimentos” se realizem de forma prática, e não apenas “sentimental”. O livre comércio permite a riqueza das nações; e só pode existir “compaixão” pelos mais pobres quando existe riqueza que nos permita não apenas chorar por eles, mas elevá-los a um estádio tolerável de existência. Diferentemente do contemporâneo Malthus, que temia a explosão demográfica dos pobres, Smith sabia que a única forma de integrá-los numa comunidade próspera era, precisamente, pela criação dessa comunidade próspera, que só a liberdade econômica seria capaz de promover.
Hoje, basta olhar para as sociedades ocidentais para ver como Smith tinha razão. Sim, o capitalismo está longe de ser a resposta milagrosa para os problemas do mundo, desde logo porque só um fanático acredita que existem respostas milagrosas para os problemas do mundo. Mas, parafraseando Churchill sobre a democracia, o capitalismo é o pior sistema econômico, com a exceção de todos os outros. O capitalismo não permite apenas a criação de riqueza; como se vê em qualquer sociedade ocidental, é precisamente porque existe riqueza criada que é possível “redistribuir”, combatendo a miséria extrema. Quando não existe riqueza criada, não existe espaço para nenhuma “benevolência” ou “simpatia”. Existe só o mundo hobbesiano que Phillips tanto teme: onde nem a sobrevivência está garantida.
Aliás, se dúvidas houvesse, bastaria perguntar a Phillips onde ele preferiria ser pobre: na Inglaterra capitalista ou na anticapitalista Coreia do Norte? Desconfio de que a Inglaterra seja mais simpática.
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